Com estrutura lamelar, materiais à base de alumínio e magnésio, desenvolvidos no LQES – Laboratório de Química do Estado Sólido, do Instituto de Química, da Unicamp, mostraram grande potencial na “descoloração” de efluentes de indústrias têxteis. O resultado foi apresentado no trabalho de mestrado de Odair Pastor Ferreira, orientado pelo Prof. Oswaldo Alves e defendido no final de julho 2001. A ideia básica do trabalho foi o desenvolvimento de metodologia para a produção dos materiais com controle da porosidade, do conteúdo dos diferentes íons metálicos e contra íons, da carga superficial e da cristalinidade. Característica interessante destes materiais é a possibilidade de serem reciclados (pelo menos por 5 vezes), via reconstrução estrutural, no processo de eliminação da cor, sem perda significativa de suas propriedades. Testes com efluentes industriais mostraram que pode ser eliminada cerca de 98% da cor de corantes aniônicos, que absorvem na região de 300-750 nm.
Como a cor dos efluentes é, sobretudo, um problema de moda, acreditam os autores que o material, dada sua versatilidade, possa ser “adaptado” para os diferentes tipos de corantes utilizados no tingimento. A performance do material desenvolvido é cerca de 50% maior que a do carvão ativo, classicamente utilizado em tais processos. O desenvolvimento em questão é o segundo exemplo de aplicação da Química do Estado Sólido ao design de materiais para a remediação de efluentes industriais realizado no LQES. Iara Gimenez, em trabalho de mestrado, desenvolveu cerâmicas porosas à base de fosfato, na qual foi imobilizada a enzima peroxidase do rabanete. O sistema mostrou elevada capacidade na descoloração de efluentes de indústrias papeleiras. Ambos os casos estão cobertos com pedidos de privilégio.
A tese: “Desenvolvimento de Materiais Porosos Bidimensionais, à Base de Al3+ e M2+ (Zn, Mg), para Uso na Remediação de Efluentes de Indústrias Têxteis”, de autoria do pós-graduando Odair Pastor Ferreira, realizada sob a supervisão do Prof. Oswaldo Luiz Alves, defendida no Instituto de Química da Unicamp em 2001, foi a vencedora do “Premio UNESCO-ORCYT a las Tesis de Maestría Defendidas en Instituiciones Académicas del Mercosur Ampliado (Prêmio UNESCO-ORCYT de Teses de Mestrado Defendidas em Instituições Acadêmicas do Mercosul Ampliado), na modalidade Química. O Prêmio UNESCO-ORCYT tem como objetivo premiar teses que tenham contribuído, de maneira significativa, para o conhecimento científico ou avanço tecnológico e que, ao mesmo tempo, tenham demonstrado excelência científica. O presente Prêmio, nessa versão, contemplou as teses defendidas nos anos de 1999, 2000 e 2001, nas áreas de Biologia, Física, Matemática e Química. Os resultados do trabalho em questão geraram uma patente, depositada pela Unicamp no INPI, em fevereiro de 2002.
O novo material surge como alternativa mais eficiente e possivelmente, mais econômica para o tratamento de efluentes de indústrias têxteis. Composto de alumínio e magnésio o material é capaz de eliminar cerca de 98% da tintura remanescente do processo industrial que utiliza corantes reativos, contra os 50% obtidos com absorventes convencionais, como o carvão ativo. Além de reduzir significativamente o impacto ambiental gerado por esse tipo de indústria, o material concebido no LQES tem uma vantagem extra sobre a solução tradicional: pode ser reciclado e reutilizado por pelo menos cinco vezes, sem perda de eficácia.
De acordo com o coordenador do LQES e orientador do trabalho professor Oswaldo Luiz Alves, os resultados obtidos em laboratório foram confirmados por testes realizados em situação real, com efluentes de uma indústria têxtil da região de Campinas. O reaproveitamento do material é feito por meio de um processo de decantação, o qual possibilita sua separação do efluente já tratado. Em seguida o corante é eliminado através de decomposição térmica: ” Isso causa algumas modificações no material, mas quando o colocamos novamente em contato com uma nova amostra do efluente, toda a sua característica inicial é recuperada. Tal ciclo pode ser repetido por pelo cinco vezes, sem que haja perda de eficiência no tratamento” , diz Ferreira. “Não se trata simplesmente de tirar substâncias inconvenientes de um lugar e depositá-las em outro. O aquecimento decompõe a substância responsável pela cor, permitindo a retomada do processo”.
A Unicamp acaba de firmar contrato de licenciamento de uma tecnologia para tratamento de efluentes industriais. Por meio do acordo, a Contech Sistemas Químicos Integrados, empresa brasileira com sede em Valinhos (SP), poderá explorar comercialmente a tecnologia, desenvolvida no Laboratório de Química do Estado Sólido do Instituto de Química da Unicamp (IQ). A tecnologia licenciada é usada na remediação de efluentes, com ênfase no aspecto de descoloração, minimizando os efeitos dos corantes sobre o meio ambiente. O professor Oswaldo Luiz Alves, responsável pela pesquisa, explica que os corantes lançados por indústrias em rios e córregos geram um problema ambiental muito sério. “Hoje, a cor de rios e córregos muitas vezes muda de acordo com a cor da moda em razão dos corantes usados para tingir tecidos”, afirma o docente.
A Contech também aposta no diferencial da tecnologia. “Além de ser ecologicamente correto por sua capacidade de reaproveitamento em vários ciclos, ele propicia ainda diversos benefícios secundários ao efluente como, por exemplo, a redução da carga orgânica total e dureza da água”, explica Ricardo Reis de Carvalho, presidente da empresa. Segundo ele, o mercado é promissor porque as empresas que utilizam os processos convencionais de tratamento atualmente disponíveis para estas aplicações enfrentam problemas para atender à legislação referente à qualidade da água tratada, em razão da baixa eficiência destes processos. Ademais, embora o foco da pesquisa tenha sido o tratamento de efluentes provenientes de indústrias têxteis, é possível fazer uma customização do material, ou seja, ele pode ser adaptado ao tipo de corante e à técnica utilizada em diversos setores industriais. “Nosso mercado-alvo são as indústrias papeleira, têxtil, e de curtumes, mas estamos convictos de que todos os setores produtivos com forte dependência da água serão beneficiados pelo uso desta nova tecnologia”, aposta Carvalho.
Para o empresário, a melhoria da qualidade da água propiciará seu reaproveitamento no processo, melhorando sua continuidade e produtividade. “Indiretamente, os usuários domésticos podem também ser beneficiados pela menor demanda de água industrial”, completa. Os pesquisadores também acreditam que, assim que chegar ao mercado, a tecnologia vai contribuir para a manutenção do meio ambiente. “O desafio agora é passar pelo sistema piloto para o de produção”, avalia Alves. Para o docente, o licenciamento representa mais uma vitória para o Laboratório de Química do Estado Sólido, que completa 25 anos de atuação em 2007. Alves explica que as pesquisas no laboratório passaram por diversas fases, desde a pesquisa básica até o processo de criação de novas tecnologias. “A pesquisa básica nos fortaleceu do ponto de vista científico. Teremos agora nosso primeiro produto no mercado”, disse o professor.
Segundo o presidente da Contech, a expectativa da empresa com o desenvolvimento desta tecnologia em conjunto com a Unicamp é adentrar fortemente na área de tratamento de efluentes em diversos segmentos industriais no Brasil e no exterior. “Estaremos realizando inovação com valor agregado e responsabilidade sócio ambiental na área de tratamento de efluentes em diversos segmentos do mercado”, coloca. O presidente diz que a previsão para que a tecnologia faça parte de seu portifólio de soluções é de aproximadamente 2,5 anos para finalização dos testes laboratoriais, escalonamento de produção e estruturação da planta industrial para a produção do material. “Nossos esforços estão voltados para encurtar ao máximo este prazo”, coloca.
A Contech atua na área química no Brasil e em países da América do Sul e da Europa, e tem como foco principal o fornecimento de sistemas e produtos químicos biodegradáveis aplicados em diversas áreas industriais, principalmente no setor de papel e celulose. No Brasil, a empresa é líder do mercado de tratamento químico contínuo das vestimentas em máquinas de papel e celulose, além de atuar fortemente no controle de contaminantes de fibras recicladas e de celulose, usando as mais avançadas tecnologias disponíveis atualmente. O projeto para desenvolvimento da tecnologia começou em 1999, sob a coordenação do professor Oswaldo Luiz Alves e, em 2001, resultou na dissertação de mestrado desenvolvida por Odair Pastor Ferreira. No mesmo ano, o trabalho foi eleito o melhor da área no âmbito do Mercosul. O depósito da patente foi feito em 2002 e desde então a tecnologia despertou o interesse de empresas. O licenciamento foi concretizado seguindo a Lei de Inovação, por meio de edital para seleção da empresa.
Para Carvalho, a interação entre universidade e indústria, que permitiu o acesso de sua empresa à tecnologia, é hoje uma realidade viável. “Existe o marco regulatório da Lei da Inovação, as agências de inovação promovem o contato [empresa e universidade], e o governo estimula projetos de PD&I através de linhas da Finep, por exemplo.” De acordo com ele, um dos reflexos desta interação é que as empresas estão contratando mais mestres e doutores para prospecção de novas tecnologias. “A Contech dispõe do Centro de Desenvolvimento & Tecnologia – CDT, onde atua um corpo de pesquisadores formado por mestres e doutores para a melhoria contínua dos produtos químicos e sistemas oferecidos, sobretudo pela prospecção de novas tecnologias”, coloca. Para o professor Oswaldo Alves, a interação entre universidade e empresa é facilitada pelo papel das agências de inovação dentro das universidades. “O papel da Inova Unicamp foi muito importante para conseguirmos essa parceria”, conclui.
Fonte: http://200.177.98.79/jcemail/Detalhe.jsp?id=2149&JCemail=2028&JCdata=2002-05-08
http://lqes.iqm.unicamp.br/canal_cientifico/em_pauta/em_pauta_novidades_28.html
acesso em maio de 2002
http://www.sbq.org.br/publicacoes/beletronico/bienio0204/boletim329.htm
http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/jornalPDF/175-pag11.pdf
acesso em março de 2003
http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/setembro2007/ju373pag02.html
acesso em outubro de 2007