A dor aguda ou crônica é um problema de difícil manejo na prática clínica em Oncologia. Em cerca de 70% dos pacientes em que se apresenta, está relacionada à infiltração tumoral de estruturas sensíveis, como músculos, vísceras, nervos periféricos e ossos. A dor óssea relacionada ao crescimento metastático tumoral é considerada como a mais freqüente síndrome intratável do câncer e, entre outros fatores, associa-se à compressão e invasão do periósteo, que é rico em inervação nociceptoras, à instabilidade óssea secundária a fraturas e ao desencadeamento de fenômenos inflamatórios em estruturas adjacentes. Toda vez que o tumor aparece nos ossos, o crescimento celular desregulado gera uma pressão interna e estimula a liberação de substâncias que provocam dor.
O Samário-153 vem sendo utilizado, nos últimos anos, como terapia para dor óssea causada por metástases de diversos tumores. A Central da Dor e Estereotaxia, Terapêutica Antálgica e Cirurgia Funcional do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer – AC Camargo de São Paulo vem utilizando o Samário-153 (EDTMP) desde 1995 com o intuito de controlar a dor secundária ao comprometimento ósseo difuso por metástases de neoplasia mamária e prostática. A baixa penetração de suas emissões protege tanto os tecidos vizinhos dos osso como a medula óssea. A biodistribuição óssea é idêntica ao do Tecnécio-99 e fornece imagens cintilográficas da mesma sensibilidade e visualização 17. Poucos países no mundo podem produzir o Samário-153 adequadamente quelado e, portanto estável, para uso médico, e o Brasil é um deles desde 1995, momento a partir do qual começamos a utilizá-lo para analgesia.
O Samário-153 é um radioisótopo que apresenta decaimento, ou seja, passa de um estado de maior energia para um de menor energia, pela emissão de partículas beta com energia de 810 KeV e radiações gama de 103 KeV. A partícula beta, por possuir massa, interage com o tecido ao seu redor logo após a sua emissão, liberando energia num trajeto de poucos milímetros e levando a efeitos citotóxicos nas áreas circunjacentes. Por esta propriedade, pode ser utilizada como terapia em alguns tipos de câncer. A radiação gama, por não possuir massa, interage pouco com o tecido ao seu redor, quando comparada com as partículas beta, sendo eliminada com facilidade do corpo humano, e podendo ser detectada por uma câmara de cintilação localizada próxima ao paciente (a radiação gama é uma das formas de decaimento radioativo ideais para a realização de imagens, com características muito parecidas às dos raios X).
Este radiocomposto é obtido através do acoplamento do Samário-153, isótopo de características físicas adequadas, ao EDTMP, um agente quelante disponível comercialmente de grande afinidade por metástases ósseas (relação de distribuição entre tecidos patológicos e não patológicos da ordem de 17:1) e eliminação urinária em aproximadamente oito horas. O Samário não tem afinidade especial por tecido ósseo e se for injetado na circulação na sua forma pura irá se distribuir por todo o organismo. Para que a radiação seja dirigida para as áreas de interesse (no caso as metástases ósseas) é necessário que o radioisótopo utilizado esteja ligado a uma substância com as propriedades biológicas desejadas. O Samário é então ligado a um fosfonato, o ácido etilenodiaminotetrametilenofosfônico (153Sm-EDTMP), que se distribuirá no tecido ósseo de forma dependente da atividade osteoblástica existente. Estima-se que 50% do material injetado por via endovenosa irá se ligar aos tecidos ósseos e parte do material restante será excretado pelos rins em poucas horas. Alguns tipos de metástases ósseas, por possuírem atividade osteoblástica aumentada, vão receber uma fração significativa do material radioativo injetado, aumentando a quantidade de radiação depositada nas áreas tumorais em comparação às sadias. Desta forma, esta terapia se aproxima do princípio da bala mágica, isto é, atua preferencialmente nas áreas tumorais, poupando o tecido normal.
Para usá-lo contra o câncer, o samário é irradiado. Ele se coloca numa ampola de injeção e enfia-se no reservatório dum reator nuclear. Depois, injeta-se uma quantidade pequena no fluxo sanguíneo do paciente, através do que atinge a área afetada. Nesse lugar, solta a dose de radiação de maneira localizada. Dessa maneira, a substância radioativa se fixa no lugar onde está afetado o osso e age localmente, por efeito radiante local. Isso acontece porque é uma substância que tem afinidade por esses tecidos onde existem metástases ósseas, age localmente com pouco efeito colateral, posto que esse sistema evita os efeitos adversos duma radioterapia mais generalizada.
A emissão de raios gama simultaneamente às partículas beta, possibilita que se realize imagens da distribuição do radiofármaco pelo organismo algum tempo após a sua administração, de forma semelhante ao que ocorre com a terapia com Iodo-131, permitindo assim a identificação e caracterização dos sítios de metástases. Muitos trabalhos têm relatado o uso do 153SM-EDTMP na terapia de dor óssea em pacientes com alguns tipos de metástases, principalmente de neoplasias de mama e próstata. Estes trabalhos relatam uma melhora completa ou parcial da dor em aproximadamente 70% dos pacientes, sem a presença de efeitos colaterais importantes. A remissão dura em média 8 a 20 semanas e uma nova dose pode ser aplicada após este período. Dentre os efeitos colaterais relatados, o mais comum é uma queda discreta a moderada, de caráter transitório, nos níveis dos leucócitos e plaquetas, sendo que as plaquetas são os elementos com queda mais expressiva. Outro efeito colateral relatado é a necrose tecidual no sítio da injeção, que apesar de pouco freqüente, pode ocorrer se houver extravasamento do radiofármaco nesta localização. Desta forma, recomenda-se cuidado especial no momento da aplicação. Apesar dos efeitos paliativos da dor óssea, e da conseqüente melhora da qualidade de vida dos pacientes, não foi constatado aumento da sobrevida em nenhuma das neoplasias estudadas.
Fonte:
http://www.fleury.com.br/mednews/0700/mdcontfcb0702.htm
http://www.sosdoutor.com.br/sosoncologia/tratamento_mednuclear.asp
http://saude.discoveryportugues.com/verticalh/h235/dseh23502.asp
http://www.aben.com.br/texto/rev24/26.htm
http://www.hcanc.org.br/sm153_3.html
http://www.comciencia.br/noticias/framenot.htm
acesso em julho de 2002