Se não em todas as áreas, com certeza na das invenções e descobertas, a História não tem sido justa com muita gente. A França, sem dúvida, foi a mãe da fotografia. Mas não se pode definir precisamente o pai. Hoje, graças ao trabalho incansável e obstinado do jornalista e professor Boriz Kassoy, um terceiro nome disputa a paternidade da fotografia: Antoine Hercule Romuald Florence, francês de nascimento, mas brasileiro de mulher (duas), filhos (20), netos, bisnetos e tataranetos. Kassoy investiu, de 1972 a 1976, numa das mais ardorosas pesquisas e reconstituições de métodos, técnicas e processos já realizadas no Brasil para levar uma pessoa do anonimato ao pódio da história.
Hercules Florence, como ficou internacionalmente conhecido a partir da publicação do livro de Kassoy, “1833: a Descoberta Isolada da Fotografia no Brasil” (editora Duas Cidades, 1980), nasceu em 1804, em Nice, e, com a ajuda do pai, pintor autodidata, estudou artes plásticas. Aos 20 anos, sua natureza inquieta e uma insistente falta de emprego o conduzem a um desconhecido Rio de Janeiro, onde passa um ano como modesto caixeiro de uma casa comercial e, depois, vendedor de livros. Através dos jornais, descobre a vinda do famoso naturalista russo Langsdorff e é aceito como segundo desenhista daquela que viria a ser uma das maiores e mais profícuas expedições científicas realizadas no Brasil dos séculos passados.
Em vista do acontecido com Rugendas, Langsdorff, após ter contratado Taunay, resolveu acrescentar à expedição um segundo desenhista, e colocou um anúncio no jornal para esse fim. Florence apresentou-se e foi logo contratado. Somava às suas aptidões artísticas um espírito prático e inventivo que lhe permitiu desempenhar tarefas de grande apoio para a expedição, nos quatro anos que com ela viajou. Após a morte trágica de Taunay assumiu o papel de desenhista oficial executou um grande número de desenhos e quadros sobre motivos da flora e da fauna, índios e outras populações da região percorrida, e ainda paisagens. Catalogou também a extensa obra deixada por Taunay e Rugendas.
Desde o retorno da viagem ao interior do país, Hércules Florence procurou inventar aparelhos de duplicação ou reprodução de registros. Deu início a sua fase de invenções. Primeiramente, para que pudesse imprimir suas anotações sobre a zoofonia, em 1829 (anotações das vozes de pássaros e animais, que fizera durante a viagem); criou, então, a “poligrafia” (1830). Seu próximo passo foi com experiências de fixação da imagem sobre papel, que o levariam, juntamente com Joaquim Corrêa de Mello, a utilizar o nitrato de prata, com sucesso em 1832. Este processo Hércules denominou em seu diário, em 1833, como “fotografia” (photographie). Hércules Florence escreveu seus diários em sua língua materna, o francês, e sempre assinou Hercule, sem o s. Sabia escrever corretamente o português, o fazia em escritos formais. Outras invenções como as do “papel inimitável” (marca d’água) para dinheiro e documentos de valores (1842), a pulvografia (impressão à pó, com cola, sobre tecido (1860) e estudos sobre a arquitetura brasileira (a ordem das palmeiras) e sobre o céu e nuvens, pensando nos jovens paisagistas, são, entre outros, assuntos ainda inexplorados.
A importância de tal verificação no uso da palavra Photographia leva-nos a afirmar a sua prioridade internacional com antecipação de pelo menos cinco anos em relação a Sir John Herschel. Trata-se do célebre astrônomo e químico inglês que iniciou suas pesquisas com a Fotografia em 1839, e cuja contribuição para o seu desenvolvimento é definitiva com a descoberta do hipossulfito de sódio como o agente fixador tão procurado pelos precursores europeus. Herschel utilizou pela primeira vez o verbo To Photograph e o adjetivo Photographk em fevereiro de 1839, algumas semanas antes que o alemão Mãdler numa publicação no jornal Vossiche Zeitung em 25/2/1839 utilizou o termo Photographie.
A contribuição de Florence à Ciência, às Artes e à História estava apenas começando. Em 1829, com o fim da expedição, ruma para São Paulo, e, em 1830, inventa seu próprio meio de impressão, a Polygrafie, já que não dispunha de um prelo. Gosta da idéia de procurar novos meios de reprodução e descobre isoladamente um processo de gravação através da luz, que batizou de Photografie, em 1832, três anos antes de Daguerre. A ironia histórica, oculta por 140 anos, é que o processo era mais eficiente do que o de Daguerre. Já em 1833, utilizou uma chapa de vidro em uma câmera escura, cuja imagem era passada por contato para um papel sensibilizado.
Foi na pequena vila de S. Carlos, que cm 1836 possuía aproximadamente 6.700 habitantes e apenas uma escola primária, que Florcnce desenvolveu suas pesquisas. A cidade de São Paulo, capital da Província, possuía na época 22.000 habitantes, estando ainda longe de abrigar algum ensino científico. Considerando o amor que D. Pedro II (1825-1891) teve pelas artes e literatura e até pela fotografia, é realmente uma pena que na época cm que Florence inventou a Fotografia (1833) o imperador contasse apenas com 7 anos de idade, tendo sua maioridade sido decretada a 23/7/1840, quando então assumiu o poder.
Com o espírito meticuloso que tinha, Hércules Florence registrava em seu diário, numa relação maior de descobertas e pesquisas: “Neste ano de 1832, no dia 15 de agosto, estando a passear na minha varanda, vem-me a idéia que talvez se possam fixar as imagens na câmara escura, por meio de um corpo que mude de cor pela ação da luz. Esta idéia é minha porque o menor indício nunca tocou antes o meu espírito. Vou ter com o senhor Joaquim Corrêa de Mello, boticário de meu sogro, homem instruído, que me diz existir o nitrato de prata”.
Construindo uma câmara escura com uma caixa de papelão, uma paleta de pintor e uma lente, Florence colocou dentro dela um papel embebido em nitrato de prata e durante quatro horas deixou-o exposto à ação da luz que provinha de uma janela através da qual viam-se os tijolos e o teto da casa em frente e parte do céu. Acabou por obter, meio sem entender, a primeira imagem negativa-positiva da história da fotografia. Registrava em seu diário que o boticário, senhor Mello, ajudara-o a batizar o invento, formando a palavra photographia (do grego photos = luz, e graphia = desenho, escrita).
Em 1833 Florence aprimora seu invento, e passa a fotografar com chapa de vidro e papel pré-sensibilizado para contato. Foi o primeiro a usar a técnica “Negativo/Positivo” empregado até hoje. Enfim, totalmente isolado, contando apenas com os seus conhecimentos e habilidade, e sem saber as conquistas de seus contemporâneos europeus, Népce, Daguerre e Talbot, Florence obteve em terras brasileiras o primeiro resultado fotográfico da história. O Nitrato de Prata, agente sensibilizante e princípio ativo da invenção de Florence, tinham um pequeno inconveniente: a imagem depois de revelada, passava por uma solução “fixadora” que removia os sais não revelados, mantendo a durabilidade da imagem. Constatou que a amônia além de ter essa função, também reagia com os sais oxidados durante a revelação, rebaixando o contraste da imagem final. Conforme seu diário, passou a usar a urina, rico em amônia como fixador “fiz isso por acaso!” De fato, um dia enquanto revelava, esqueceu e preparar o Fixador tradicional. Como a vontade e urina apareceu de repente, não poderia abrir a porta de seu laboratório, com risco de velar seus filmes. Acabou urinando em uma banheira e na confusão, acidentalmente passou suas chapas para lá. Além de descobrir a própria fotografia, descobriu também o processo mais adequado para a fixação da imagem, que atualmente foi substituído pelo “Tiossulfato de Amônia” ou FIXADOR RÁPIDO utilizado atualmente na fotografia Preto & Branco, Colorida, Cinema, Artes Gráficas e Radiologia.
Desde o início Florence. auxiliado por Joaquim Corrêa de Mello, teve em mente que o emprego do nitrato de prata seria a solução ideal para a criação de uma superfície sensível, e capaz de capturar as imagens refletidas dos objetos na câmara escura. Deu a tal idéia o nome de Photographia, já que a luz desempenha o principal papel. Ainda em janeiro de 1833, Florence fotografou através da camera obscura; obteve cópias de originais, trabalhando com o vidro como negativo e papel sensibilizado utilizando-se de estantes como prensas e imprimindo por contato, pela luz do sol. Embora os 2 exemplares que ainda hoje existem sejam trabalhos reprográficos, a sua importância não diminui como um inventor independente pois suas técnicas fotográficas são muito bem descritas nos manuscritos. Pesquisou diversos preparados químicos para imprimir além do nitrato de prata, principalmente o cloreto de prata e o cloreto de ouro, e utilizou-se da amônia e até da urina como agente fixador.<br
Florence descreve sua invenção: “O aparelho Consiste em cinco ou seis fragmentos quadrados de vidraça. Pode-se empregar menos; ou um maior número. Seu tamanho dependerá dos desenhos que se desejar imprimir. Soca-se fuligem misturada com goma arábica dissolvida e, para saber se estão convenientes as proporções, estende-se em vidro próprio para ensaios leve camada desse composto. Feita a secação, desenha-se com um buríl: se a camada opõe demasiada resistência ao traço, e se ela descasca, há excesso de goma; se, ao contrário, esfregando-se ligeiramente com o dedo bem seco, ela se suja, a quantidade de goma é mínima. Lava-se bem o vidro que deve servir de prancha, o qual se cobre com uma camada de composto negro; quanto mais ela se apresenta leve tanto mais (palavra ilegíveis por dilaceracao da página) … ser transparente e, para se ter certeza disso, põe-se o vidro diante do sol e passa-se a mão por trás com os dedos abertos, para ver se se distingue a sombra. Não se pode, todavia, impedir, que esta apareça um pouco, porquanto seria preciso dar demasiada espessura a dita camada e não se poderiam fazer traços delicado. Para que essa camada seja igual e pouco espessa, mergulha-se um grande pincel no negro dela; estende-se a camada, partindo-se de uma extremidade do vidro e indo-se, sempre por linhas paralelas, à que fica do lado oposto; faz-se o mesmo quanto às outras três extremidades e, se formam bolhas ou se a cor se nega a aderir ao vidro, continua-se até que isso nao mais ocorra. Sobram sempre aberturazinhas, mas e mâo se esparrama alvaiade sobre a prancha, esmagando-o entre o polegar e o indicador e deitam-se fora os grãozinhos duros que se perceberem, esfregando-se a seguir, com o indicador, o alvaiade, pura espalhá-lo bem. Ê o suficiente, para tapar os buracos e branquear a piancha, a fim de se verem melhor os traços do desenho. Não se pode. no entanto, deixar lodo o alvaiade, que é preciso retirar com um lenço fino, já que a poeira, em seguida, obstruiria os traços.
“Para o desenho no vidro usam-se agulhas de coser, ligadas a cabos de madeira ou, o que e mais expedito, a dorsos de penas; usam-se grossas, finas, pontudas e sem ponta, redondas e achatadas. Achatam-se as agulhas com uma lima fina, aquecendo-as à chama de vela (palavras ilegíveis, etc.) sobre pedra de amolar canivetes (palavras ilegíveis, etc), a agulha sai muito fora do cabo. [p. 45] Inicialmente se traça o desenho em papel transparente e sobre este se esfrega alvaiade, que o fixa à prancha, e passa-se, no avesso, um buril pelos traços, ficando o desenho, assim, reproduzido em sentido oposto, na prancha, a fim de que, nas provas surja em seu verdadeiro sentido. Põe-se sob a prancha um pano bem preto, porque, estando transparentes os traços, e a camada negra mais clara do que o tecido, que está na sombra, se apreciará melhor o tmbalho. Só falta gravar. O trabalho se faz com os buris mencionados acima e a maneira da gravura sobre cobre, com a diferença de que é mais fácil e pronto e de que se trabalha tão livremente quanto a pena, sem virar a prancha nem a mão. porquanto se percebe que c mais fácil gravar sobre uma simples camada preta ligeiramente gomada, do que sobre cobre. Já gravei, dessa forma, grande número de desenhos. Fazia-os tão nítidos e delicados quanto oca mais fina gravura. E quanto menos espessa a camada, tanto mais lindos desenhos se podem fazer. À medida que trabalhamos, junta-se poeira, que se origina do negro. retirado pelo buril, poeira que se faz desaparecer, utilizando-se um pincel fino e seco. De tudo o que acaba de ser dito, conclui-se que o desenho é feito à luz, isto é, que, posta a prancha contra a claridade, percebe-se a luz através dos traços”.
Florence reconhece o impacto de sua invenção: “Quando for conhecido meu segredo de pintar exclusivamente pela ação da natureza, haverá os que dirão, talvez, que a pintura ficará reduzida a uma arte mecânica, que os desenhos e quadros feitos nos moldes de tal segredo, serão muito naturais, muito apreciáveis, porém, que não mais se admirará o talento do artista e que ele não mais produzirá a emoção devida no sentimento e à delicadeza que nele se teriam podido reconhecer …. [20 de junho de 1833] A ação da luz desenhou-me os objetos na câmara escura. Ela só fixava as grandes formas, os contrastes salientes e. assim mesmo, com o defeito de converter em claros os escuros e vice-versa. Contudo esse meio de obter os desenhos produzidos pela natureza e não pela mão do homem, esse meio que, sob tal aspecto, já desperta tanto interesse, sem embargo de sua precariedade, não é suscetível de aperfeiçoamento? Não teria eu iniciado a arte mais do que maravilhosa de desenhar qualquer objeto, sem dar-me ao Trabalho de o fazer com a própria mão? Parece-me que vale a pena agarrar-me a essa probabilidade e persegui-la. Se não estiver aperfeiçoada dentro de 5 anos, talvez o estará dentro de 10, 15 ou 20. Como seria agradável converter a natureza em pintora de todos e tudo! Quanto não seria útil economizar o tempo e o trabalho que há em apanhai uma vista! Esperando, pesquisarei alguns Aperfeiçoamentos”.
Embora suas notas pessoais datem de 1833, suas pesquisas aparecem em um artigo publicado no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro apenas em 29/12/1839, em que transcreve a mesma matéria publicada no jornal paulista A Phenix (n.°175) de 26/10/1839: “Comparem os leitores as datas, e decidam se o mundo deve a descoberta da Photographia, ou pelo menos da Polygraphia, à Europa ou ao Brazil”. Compreende-se, portanto, sua amargura e frustração quando em 1839 cerca de sete anos mais tarde, estando na farmácia do doutor Engler, em Itu, ouviu que o “Jornal do Comércio” do Rio de Janeiro anunciava que um pintor francês, Daguerre, descobrira em Paris um processo de fixar imagens por meio da incidência da luz sobre uma placa de metal. Já em 1834 Hércules Florence desabafara em seu diário, amargurado: “Eu inventei a fotografia; fixei as imagens na câmara escura; inventei a poligrafia… Minhas descobertas estão comigo, sepultadas no olvido; meu talento, minhas vigílias, meus sacrifícios, são estéreis para os outros… Se eu estivesse em Paris, lá encontraria, talvez, pessoas que me escutassem, mas aqui não vejo ninguém a quem possa comunicar minhas idéias. Os que me poderiam ouvir só pensam nas suas especulações e na política”. Em 1839, acrescentaria: “A fotografia é a maravilha do século. Eu também já tinha colocado as bases, tinha previsto essa arte em sua plenitude; eu a realizei antes do processo de Daguerre, mas trabalhei no exílio. Eu imprimi pelo sol sete anos antes que se falasse em fotografia, e eu tinha dado esse nome. Entretanto, a Daguerre as honrarias”.
Em sua notas Florence escreve: “Senti um choque no coração, no sangue, na medula dos ossos, em todo o meu ser. Recalquei ao máximo o mais rude choque que já me foi dado experimentar, e assim, não perdi a compostura….tudo, em mim, era melancolia, «tendida ao que havia em derredor. Os objetos e os sons faziam-se confusos. Apesar disso, sustentava razoavelmente minha parte da conversação, nessa reuniaozinhs de amigos. Sofria. Ceei, é verdade que com bastante apetite, e fui deitar-me crente de que uma noite tormentosa me esperava, porque meu mal-estar moral era intenso. Dormi, no entanto, passavelmente bem”.
As descrições sobre suas invenções constam de seus manuscritos, principalmente, de “L’Ami des Arts Livre par Lui-même”, onde também estão relatadas suas observações sobre a Expedição Langsdorff. Suas descrições e desenhos sobre as características físicas, habitações e costumes dos índios, poderiam ser considerados precursores da antropologia visual em nosso país. Hércules Florence introduziu a impressão gráfica no interior de São Paulo, com sua Poligrafia (1830) e posteriormente, criando sua tipografia, onde também imprimiu o primeiro jornal do interior paulista, O Paulista (1842), com a participação do Padre Diogo Feijó. Alguns exemplares das forografias tiradas por Florence existem até hoje, e podem ser vistos no Museu da Imagem e do Som, SP. Sua contribuição, entretanto, só ficou sendo conhecida pelos habitantes de sua cidade, e por algumas pessoas na Capital de São Paulo e Rio de Janeiro, não surtindo, na época, qualquer outro tipo de efeito.
Enquanto toda a Europa no período do século XIX passava por profundas revoluções no universo artístico, cultural, intelectual implodidos pelo advento da fotografia, no Brasil o invento de Daguerre era recebido com outra conotação. Poucos meses se passaram da tarde de 19 de agosto de 1839, quando a invenção foi consagrada em Paris, para que a fotografia logo chegasse ao Rio de Janeiro em 16.01.1840, trazida pelo Abade Louis Compte, de posse de todo o material necessário para a tomada de vários daguerreótipos, conforme ilustra o Jornal do Commércio deste período: “É preciso ter visto a cousa com os seus próprios olhos para se fazer idéia da rapidez e do resultado da operação. Em menos de 9 minutos, o chafariz do Largo do Paço, a Praça. do Peixe e todos os objetos circunstantes se achavam reproduzidos com tal fidelidade, precisão e minuciosidade, que bem se via que a cousa tinha sido feita pela mão da natureza, e quase sem a intervenção do artista”.(Jornal do Commércio, 17.01.1840, p.2).
Compte dava uma demonstração especial para o Imperador D.Pedro II, registrando alguns aspectos da fachada do Paço e algumas vistas ao seu redor. Estes e muitos outros originais se perderam e já em novembro, surgem os primeiros classificados da venda de equipamentos fotográficos na Rua do Ouvidor, 90-A… Desde o dia que Compte registrou as primeiras imagens no Rio de Janeiro, D Pedro II se interessou profundamente pela fotografia, sendo o primeiro fotógrafo brasileiro com menos que 15 anos de idade. Tornou-se praticante colecionador e mecenas da nova arte. Trouxe os melhores fotógrafos da Europa, patrocinou grandes exposições, promoveu a arte fotográfica brasileira e difundiu a nova técnica por todo o Brasil. Apesar de todos os seus esforços a febre da fotografia no Brasil não poderia ser comparada aos Estados Unidos daquela época, devido às diferenças econômicas…
Com seu ensaio político “Os Sertanistas”, sobre a ocupação das fronteiras (durante a Guerra do Paraguai), Hércules revelou extremado sentimento patriótico pelo Brasil, confirmando o que já havia ocorrido na prática com sua participação, com a Padre Feijó, no movimento liberal de 1842. Em maio de 1855 Hércules foi a Europa, após uma ausência de 30 anos; e em Mônaco ainda logrou abraçar a sua veneranda mãe. Poucos meses se demorou ele em França, para onde seguira unicamente com o fim de cumprir o seu dever filial. De volta a Campinas, Hércules consagrou os seus labores à vida rural, em parte, e às suas pesquisas científicas, que nunca abandonou, apesar de todos os dissabores e das desilusões que sofreu. Hércules Florence faleceu no dia 27 de março de 1879, aos 75 anos, em Campinas, cidade onde viveu mais de 50 anos, considerado um cidadão insigne.
Além disso, deve-se a Florence o registro minucioso, através de seu diário de campo (1825-1829), de todos os trabalhos e peripécias da expedição. Deixou cerca de 2 mil páginas escritas, uma parte das quais ainda inédita, em manuscrito conservado pela sua trineta Teresa Cristina Florence, moradora em Campinas (SP). Esses textos incluem também o livro L’Ami des Arts livré à lui-même, amplamente ilustrado, em que relaciona as suas numerosas invenções e registra episódios da vida cotidiana na sua fazenda. Outros trabalhos seus, principalmente desenhos e quadros, encontram-se na coleção de sua bisneta Leila Florence Moraes, no Rio Grande do Sul.
No início de 1813, chegou ao Rio de Janeiro o barão Georg Heinrich von Langsdorff, para chefiar o Consulado Geral da Rússia, a mando do czar Alexandre I. Médico, membro da Academia de Ciências de São Petersburgo, o barão, nascido na Alemanha, viria a assumir a cidadania russa, com o nome Grigori Ivanovitch Langsdorff. O principal objetivo do império russo era a expansão das relações comerciais com o Brasil, no passado dificultadas pelo embargo imposto pela coroa portuguesa. Em abril de 1821, fazem escala no Rio de Janeiro, as corvetas Mirny e Vostok, da expedição chefiada por outro nobre de nome alemão, também a serviço do czar, Fabiano Tadeu Gotlieb von Bellingshausen, que acabara de completar a circunavegação do globo e se tornara o descobridor da Antártida. Langsdorff e outros diplomatas russos embarcam nos navios da expedição e regressam à Europa. Pouco antes, o rei D. João VI partira do Rio para Portugal, deixando D. Pedro I como príncipe-regente.
Em março de 1822, Langsdorff está de volta ao Rio de Janeiro, com a autorização do czar para organizar uma expedição científica no Brasil. Langsdorff relaciona-se diretamente com D. Pedro I (seu hóspede na Fazenda Mandioca) e com José Bonifácio de Andrada e Silva – ambos próceres da Independência, declarada em 7 de setembro de 1822. O governo imperial brasileiro, em apoio à expedição Langsdorff, concede-lhe vultoso crédito e privilégios alfandegários. Em 1824, a expedição se inicia, com uma primeira viagem a Minas Gerais. Seu objetivo: realizar “descobertas científicas, investigações geográficas, estatísticas e o estudo de produtos desconhecidos no comércio”, bem como fazer uma coleção de “objetos de todos os reinos da natureza”. Em setembro de 1825, a expedição iniciou as pesquisas na Província de São Paulo. Partindo de Porto Feliz, em 22 de junho de 1826, com apoio do médico e líder político Francisco Álvares Machado (o futuro sogro de Florence), a expedição tem por meta atingir o rio Amazonas, por via fluvial.
O porto de Cuiabá é alcançado em 30 de janeiro de 1827. A viagem só se reinicia em 5 de dezembro, dividida em dois grupos: o primeiro, com Langsdorff, Hércules Florence e o astrônomo Rubtsov, oficial da Marinha russa, dirige-se ao rio Tapajós, por onde alcançam Santarém, em 1o de julho de 1828. Neste trecho, Langsdorff e outros expedicionários adoecem gravemente. O outro grupo, que demanda os rios Guaporé, Mamoré e Madeira, sofre ainda pior sorte. Em 14 de fevereiro de 1828, afoga-se no rio Guaporé o primeiro desenhista, Aimé Adrien Taunay, de 25 anos. A expedição, finalmente reunida em Belém, regressa por navio ao Rio de Janeiro em 13 de março de 1829. Os registros e materiais científicos da Expedição Langsdorff – referentes a zoologia, botânica, mineralogia, etnografia, medicina, linguística etc. – estiveram praticamente 100 anos perdidos nos arquivos das instituições científicas, da Marinha e da diplomacia da ex-URSS, em Moscou e Leningrado. O diário de Florence só foi publicado, em versão resumida, em 1875, traduzida pelo Visconde de Taunay, na revista do Instituto Histórico Brasileiro. E na sua versão completa, traduzida por Francisco Álvares Machado e Vasconcellos Florence, apenas em 1977.
Após o término da expedição, Florence resolveu estabelecer-se definitivamente na então Vila de São Carlos, hoje Campinas (SP), casou-se duas vezes e teve 20 filhos. Tornou-se agricultor e fazendeiro e dedicou-se, além da pintura e da poesia, a suas invenções, tendo passado à história como um pioneiro da descoberta da fotografia e da poligrafia (método semelhante à mimeografia atual). A invenção desse sistema de impressão possibilitou o aparecimento do primeiro jornal na região, “A Aurora Campineira”. Foi pioneiro também ao escrever um tratado de zoofonia (as vozes dos animais).
A obra iconográfica de Florence e os apontamentos de seu diário são considerados uma das mais importantes e confiáveis contribuições ao conhecimento dos povos indígenas brasileiros e da natureza das regiões que habitavam, no começo do século 19. No Museu Paulista, estão expostos quadros baseados nos desenhos de Florence e Amado Adriano Taunay. Hoje, graças principalmente às pesquisas e à divulgação feita pelo brasileiro Boris Kossoy, o nome de Hércules Florence já tem reconhecimento, inclusive na França, desde 1988, como um dos inventores da fotografia. Diz Kossoy em seu livro que na realidade existem várias maneiras para se alcançar o processo fotográfico, mas que as experiências de Florence foram bem diferentes das realizadas pelos demais inventores, na época. Kossoy fez com que a técnica utilizada por ele fosse reproduzida em 1976 nos Estados Unidos, nos laboratórios do Instituto de Tecnologia de Rochester o resultado foi a comprovação científica da validade e da precedência da descoberta feita por Florence. O livro e o trabalho de Kassoy, incluindo a reprodução dos métodos registrados por Florence nos laboratórios do Rochester Institute of Technology, levaram ao reconhecimento internacional do pesquisador franco-brasileiro e até a França assimilou que a fotografia tem múltiplas paternidades.
Fonte: http://www.fujifilm.com.br/comunidade/cont_historia.htm
http://www.uol.com.br/cultvox/revistas/pb3/tesouroinestimavel.htm
http://360graus.terra.com.br/geral/news_geral_059.htm
acesso em dezembro de 2001
http://www.companhiavirtual.com.br/cyberjeca/galeria.shtml
http://www.herculesflorence.kit.net/biografia.htm
http://www.herculesflorence.kit.net/hercules.htm
acesso em dezembro de 2002
http://www.cotianet.com.br/photo/hist/Enio03.htm (Cristina Oka e Afonso Roperto)
acesso em setembro de 2003
http://www2.uol.com.br/sciam/materia_capa_10.htm
acesso em novembro de 2003
http://pt.wikipedia.org/wiki/H%C3%A9rcules_Florence
acesso em agosto de 2007
Hercules Florence, 1833: a descoberta isolada da Fotografia no Brasil, Faculdade de Comunicação Social Anhembi, Boris Kossoy, São Paulo, 1977
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