Um homem que viveu na simplicidade. A mesma que a fez desenvolver tecnologias para os que não podem usufruir e inventos como fogareiro econômico para carvão vegetal, um lampião tipo aplique, ferro a gás. Seu nome, Bernardo Cruz Gondim, ou mestre Bernardo, como ficou conhecido entre os amigos e alunos dos cursos de Agronomia e Engenharia da Universidade Federal do Ceará (UFC), que conviveram com ele na década de 80. Apesar de nunca ter freqüentado cursos de nível superior, era considerado um ‘‘doutor’’ pelo conhecimento que adquiriu sobre gasogênio e combustão. Esse pesquisador e inventor fortalezense, quase desconhecido, morreu aos 93 anos sem presenciar a homenagem que a mulher Rita Gondim, 63, pretendia fazer. Um pequeno museu que seria montado em uma das salas da casa que estavam construindo em Pentecoste. ‘‘Tudo muito simples, mas feito com muito amor’’, confessa a viúva. A idéia continua de pé. Para lá serão levados todos os seus pertences, como livros, fotos, móveis.
A pesquisa do economizador de combustível para veículos automotores movidos à gasolina ou álcool, financiada pelo Banco do Nordeste, com recursos do Fundeci – Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – é fruto da engenhosidade do engenheiro agrônomo cearense Bernardo Cruz Gondim, de 93 anos de idade. Ele iniciou a pesquisa há 20 anos, quando se aposentou como professor do Curso de Agronomia da Universidade Federal do Ceará. Gondim testou, com sucesso, o equipamento num automóvel Gol 86. Devido à idade avançada do inventor, a pesquisa – já em fase de caracterização operacional – está sendo continuada por dois pesquisadores do Nutec, Miguel Azevedo e Carlos Peres. Testes preliminares mostram que a ferramenta pode reduzir em 50% o consumo de veículos automotores, sem redução da sua performance, além de diminuir em 40% a emissão de gases poluentes.
Seu Bernardo concluiu o segundo grau, hoje ensino médio, fez curso de Mecânica Diesel e muitos outros sobre gasogênio, no Rio de Janeiro, dedicando-se a difundir essa tecnologia por todo o País. Por conta disso, construiu em 1975 uma unidade gaseificadora, em Brasília. No final de 80, foi convidado pelo Núcleo de Tecnologia da UFC (Nutec) para aperfeiçoar o gasogênio metálico, onde permaneceu até se aposentar como auxiliar de pesquisa. Ministrou cursos sobre gasogênio e chegou a receber medalha de honra ao mérito, em Natal. Solteirão convicto, mudou de idéia quando conheceu dona Rita, na cantina da Biologia, na UFC. Ela conta que, no começo, ele era um cliente igual aos outros. Só depois veio a paixão de ambos os lados. Bernardo casou pela primeira vez há três anos e meio. Antes de oficializar a união no Civil e no Católico, passaram 16 anos vivendo juntos. Ele à época com 78 anos. Quando mudou-se para casa da mulher, fez questão de trazer seu poucos objetos: uma mala de viagem, uma cômoda, um guarda-roupa, todos os livros e a coleção de bonés. Afinal, essa peça era fundamental no seu dia-a-dia, assim como os óculos escuros.
Quando conheceu Rita, ganhou seis filhos, netos e bisnetos do primeiro casamento da companheira. Ela lembra que Bernardo ou ‘‘Veinho’’, como carinhosamente o tratava, nunca teve grande ambições ou pretensões de ficar rico. O pouco que tinha, muitas vezes investiu nas suas pesquisas e inventos. Depois de anos de estudo sobre gasogênio, dedicou-se ao último trabalho na área de fontes alternativas de energia. Foi mais de uma década de pesquisas até conseguir resultado satisfatório, já em 1985. Ele apostava nesse trabalho como sendo o mais importante já realizado e que lhe renderia o reconhecimento da sociedade e dinheiro que permitisse dar uma vida tranqüila para dona Rita e fazer a doação para Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza, ” Morreu sem ver seu sonho realizado”, lembra. O projeto tem financiamento garantido e está em andamento. Por conta das pesquisas, seu Bernardo costumava dormir de madrugada. Para compensar as noites de sono perdidas, boa alimentação, meditação e esteira. Era vegetariano havia 40 anos. A caminhada na esteira era feita debaixo de uma pirâmide que mantinha na sala. Sua maior preocupação era com a visão. Chegou a ser operado de catarata, como não repetiu o procedimento com o outro olho, acabou ficando sem enxergar. Sem poder mais se dedicar à leitura, entrou em depressão e morreu. Mas não sofria de nenhuma doença degenerativa como diabetes e hipertensão arterial.
Foram muitas as invenções do Sr Bernardo. Em 1941 construiu uma retorta metálica. Por meio desse equipamento podia-se obter gás metano a partir de pequenos pedaços de madeira, armazená-lo em gasômetro e, assim, utilizá-lo em lampiões iguais aos que usam biogás ou gás de cozinha como combustível. Em 1953 patenteou o lampião tipo aplique, invenção que o fez criar uma pequena indústria deste produto. Com base nos seus conhecimentos sobre a tecnologia de gasogênio, construiu em 1975, em Brasília, uma unidade gaseificadora. Foi convidado a integrar o Grupo Interinstitucional de Energia Solar (Gies), em 1977, vinculado à Superintendência de Desenvolvimento do Ceará (Sudec). Com apoio dos membros do Gies, adaptou um carro para uso do gasogênio como combustível.
Em 1978 e 1979 trabalhou no Núcleo de Fontes não Convencionais de Energia, onde juntamente com os professores Osvaldo Carioca e Antinous Carvalho, projetou e construiu o primeiro forno mecânico vertical para produção de carvão a partir do babaçu. Requereu patentes dos inventos Fogareiro Econômico para Carvão Vegetal e Gaseificados de Chama Invertida com Fornalha Cônica e Aquecedor de Ar para Madeira, em 1979. No mesmo ano, solicitou a patente de outro resultado de suas pesquisas, o Gasogênio de Alvenaria para Madeira de Chama Invertida com Ventaneira Central e Secador. Em 1980 projetou e construiu quatro gasogênios para um projeto de pesquisa. No final de 1980 foi convidado pelo Nutec para aperfeiçoar o gasogênio metálico e ficou trabalhando na instituição até sua aposentadoria. Em 1985, requereu patente de mais um trabalho, o Aquecedor de álcool hidratado para motores do ciclo Otto.
Fonte: http://www.noolhar.com/opovo/fortaleza/204990.html
acesso em janeiro de 2003
http://diariodonordeste.globo.com/2001/10/26/060002.htm
acesso em abril de 2010
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