Mecânica

Sistema Bi-Plus

No comando desde 1997 da Brasilata, uma das maiores fabricantes brasileiras de latas de aço, o executivo Antonio Carlos Teixeira Álvares gosta de dizer que o maior feito de sua gestão foi ter formado um time de 900 inventores. Esse número corresponde ao total de funcionários da companhia. “Estimulamos as pessoas a dar idéias e temos um sistema eficiente de coleta e análise de sugestões para novos produtos e processos”, diz ele. Nas fábricas, há uma série de quiosques espalhados para coletar as idéias dos funcionários. Elas já se transformaram em 45 patentes registradas no Brasil e no exterior, como a do sistema de abertura de latas ploc-off, que facilita o manuseio, ajuda na conservação dos alimentos após a primeira abertura e economiza material na produção da embalagem. De onde saiu a idéia? “Foi de uma funcionária do nosso departamento de recursos humanos”, diz Álvares. 

Antonio Carlos Teixeira Álvares é engenheiro de Produção pela Escola Politécnica da USP, pós-graduado em administração pela FGV-EAESP, onde é professor, desde 1974. Seus interesses de pesquisa envolvem humanização da produção, inovação, estratégia industrial e análise de investimentos. Desde 1978 é Diretor Superintendente da Brasilata S.A. Embalagens Metálicas e, desde 2004, é Presidente do Sindicato da Indústria de Estamparia de Metais do Estado de São Paulo.

As primeira latas de aço surgiram no início do século XX. o seu desenvolvimento foi, como muitos outros da história, impulsionado por necessidades militares, tendo sido de especial importância no caso, o apoio de Napoleão Bonaparte, que necessitava de um processo confiável para a preservação de alimentos. Na época, os soldados franceses, morrim nos campos de batalha atingidos não só pelas balas dos adversários, mas também pela fome. Em 1812, começaram a surgir os primeiros alimentos acondicionados em latas de aço; em 1813 a Marinha e o Exército ingleses passaram a utilizá-la com esse propósito. As primeiras latas eram feitas de modo artesanal, uma a uma, por ferreiros em chapas de ferro batido que posteriormente eram imersas em estanho líquido para serem protegidas da corrosão. A guerra civil americana provocou um grnde avanço na indústria de latas, fazendo-as saltar de uma produção de 5 milhões de latas, no início do conflito, para 30 milhões ao seu final, cinco anos depois.

O desenvolvimento das latas de aço foi então impulsionado pela Revolução Industrial, que possibilitou a mecanização da fabricação das latas e também de chapas de aço de baixo teor de carbono. Assim, a matéria prima fundamental para a produção da lata passou a ser a chapa de aço recoberta por uma fina camada de estanho, conehcida no Brasil como folha de flandres. No final do século XIX, a lata de aço de tr~es peças (fundo, corpo e tampa) já era produzida de forma muito semelhante à dos dias de hoje, não obstante à numerosas inovações desde então, como por exemplo a utilização de vernizes internos desde 1920, o desenvlvimento do processo eletrolítico para o estanhamento de folha de flandres, a partir de 1940 e a substituição da solda à base de chumbo por solda elétrica no início da década de 1960. Apesar dessas inovações a aparência externa da lata de aço pouco mudou nos útlimos 100 anos. 

O Fechamento Plus constitui uma concepção de tampa para lata de aço para tintas radicalmente diferente da concepção introduzida no início do século. O fechamento tradicional dessas latas baseou-se em atrito por múltipla pressão, e teve origem numa invenção de John Hodgson, que obteve do Patent Office norte-americano a patente nu 795.126, expedida em 1905. De lá para cá, muitas tentativas foram feitas em diversos países para modificar o processo de fechamento, mas nenhuma alcançou sucesso, de modo que o fechamento por atrito se tornou um padrão mundial por mais de 90 anos. O Fechamento Plus inventado pela Brasilata não é um aperfeiçoamento, mas uma ruptura que introduz uma solução completamente diferente da tradicional, isto é, o fechamento por travamento mecânico, e que provavelmente deverá se constituir no novo padrão daqui para a frente em face dos seguintes benefícios: é cerca de três vezes mais resistente que o fechamento por atrito em relação às pressões internas, bem como aos choques, às pancadas e ao tombamento, conforme comprovado por testes efetuados por uma renomada instituição de pesquisa, o Centro de Tecnologia de Embalagem (Cetea/Ital); é mais fácil de abrir e fechar, ao mesmo tempo em que dificulta a violação; apresenta uma economia de material que, dependendo do diâmetro da lata, varia de 19 a 25% no conjunto anel-tampa, comparado com o sistema convencional. As vantagens são tantas que somente no mercado americano a adoção do novo sistema produziria economia anual superior a US$10 milhões, de acordo com uma estimativa conservadora. 

No início da década de 1990, a equipe de vendas da Brasilata começou a receber de seus dois maiores clientes de tintas, donos das marcas mais vendidas no Brasil (Suvinil e Coral), demandas no sentido de produzir embalagens que dificultassem uma prática indesejável que estava se tornando cada vez mais comum: a falsificação de tintas. A prática era a seguinte: alguns indivíduos, e mesmo empresas inescrupulosas, estavam comprando latas vazias de 18 litros, usadas, limpavam-nas com cuidado e, em seguida, adquiriam latas novas de tinta, abriam-nas e, pela adição de água, logravam obter duas ou mais latas que eram então vendidas como novas. Para coibir tal prática, o então gerente de qualidade da Brasilata teve a idéia de alterar o perfil do anel da lata de tinta de 18 litros, introduzindo um relevo que era marcado no ato de abertura da tampa. O relevo não impedia uma eventual violação, porém a evidenciava claramente, dentro do conceito internacionalmente usado para latas de produtos alimentícios (tamper evident). O gerente de vendas achou que a solução atendia totalmente à demanda dos clientes, e foi dele a idéia de “batizar” a nova lata com o nome de First Open, em alusão à indicação da primeira abertura da lata. O sucesso foi grande, e em 1994 a lata de 18 litros com fechamento First Open ganhou o prêmio Embanews na categoria tecnologia. 

A concorrência, incomodada com o sucesso da Brasilata, tratou de produzir também a sua lata tamper evident, denominada Latalimpa, que resolvia de quebra um outro problema ocasionado pela existência de cantos vivos de aço nas bordas do anel. Tais cantos, na folha metálica, além de poderem provocar ferimentos na mão do pintor, expunham o aço não-revestido, fato que com o passar do tempo causava oxidação e, algumas vezes, sujava a tinta. O lançamento da nova lata da concorrência caiu como uma bomba na equipe técnica da Brasilata, que se debruçou para achar uma solução que também resolvesse o problema dos cantos vivos na lata First Open. Em apenas 24 horas, um técnico experiente, após várias simulações no sistema de projeto auxiliado por computador (CAD), apresentou uma proposta. A solução previa o enrolamento para fora da extremidade interna do anel da lata, formando um cordão e eliminando o canto vivo e, ao mesmo tempo, um “canal” na borda externa da tampa, permitindo o encaixe da tampa com o anel, conforme o esquema mostrado na figura abaixo.

O esquema proposto resolvia, sem dúvida, o problema do canto vivo do anel, tendo sido esta a razão primeira da sua proposição. Entretanto, ficou claro desde o início que a introdução de uma trava mecânica entre o anel e a tampa melhorava sobremaneira a condição de fechamento da lata e, conseqüentemente, evidenciava ainda mais a primeira abertura. A aprovação da diretoria foi imediata, todos os recursos necessários foram mobilizados e em poucos dias o primeiro protótipo foi produzido pela equipe de ferramentaria. O próprio diretor superintendente batizou a lata com o nome de First Open Plus. Em apenas 90 dias a nova lata estava no mercado. Em 1995, o fechamento First Open Plus ganhava para a Brasilata o segundo prêmio Embanews de tecnologia. 

Em 1995, em conversa com Alexandre Cenacchi, presidente da Sayer Lack, um importante cliente, o diretor superintendente recebeu a solicitação da produção de uma lata redonda para tintas mais barata. A lata de tinta tradicional, como vimos, fora desenvolvida no início do século passado, e seu sistema de fechamento baseava-se em atrito por múltipla pressão. O que o cliente indagava era se não seria possível a adoção de uma tampa de pressão simples, como as utilizadas para as latas de leite em pó. O diretor da Brasilata sabia, e concordava, que a deficiência de vedação da pressão simples era inaceitável para a indústria de tintas. A tinta necessita de uma lata com vedação mais robusta do que a de leite em pó, devido as suas características em termos de peso, pressões internas etc. Apesar de ser impossível naquele momento atender à solicitação do cliente, esse assunto despertou o interesse do diretor da Brasilata, pois se o fechamento baseado em atrito por múltipla pressão pudesse ser evitado a economia de matéria-prima seria considerável. Nesse caso seria necessário conseguir uma vedação eficiente, para a qual não existia ainda nenhuma solução conhecida.

Na viagem de Jundiaí (sede do cliente) a São Paulo, o diretor chegou a considerar a solução First Open Plus, porém a descartou por achar que seria muito complicada a transposição da solução da lata quadrada para a redonda. Já em São Paulo, reuniu-se com a equipe técnica a fim de discutir o assunto e, para sua surpresa, viu aparecer a mesma sugestão. Foi formado então um grupo de trabalho para estudar o assunto com os melhores técnicos, que seriam o embrião de uma futura equipe de desenvolvimento de produto, hoje composta por cinco técnicos de excelente capacidade, três dos quais remanescentes daquele grupo de trabalho. Foi preciso muita imaginação para transportar a solução para a lata redonda; muitas tentativas foram feitas, e cerca de três meses depois foram fornecidas ao cliente as primeiras latas redondas com capacidade de 900ml e o novo fechamento por trava mecânica. Para ser diferenciado do sistema da lata quadrada, ele recebeu o nome de Fechamento Plus. Durante esse processo a Brasilata contou com apoio da Finep, que financiou, entre outras atividades, a aquisição de materiais e a realização de testes de mercado.
No final de 1995, o sistema foi apresentado em um evento, em que a Brasilata estava recebendo de seu principal cliente, Tintas Coral, o prêmio de Fornecedor do Ano. A solução encantou Júlio Cardoso, então presidente das Tintas Coral, tendo sido firmada uma parceria para desenvolvimento do novo fechamento. Foi então a vez do trabalho árduo: a idéia original teve de ser modificada várias vezes, até mesmo para permitir a conciliação com as linhas de enchimento, que deveriam ser compatíveis com os dois sistemas, o Plus e o convencional. O processo de produção das tampas em alta velocidade teve de ser mudado mais de uma vez. Um equipamento especial teve de ser projetado com a Indústria de Máquinas Moreno, isto é, toda uma nova tecnologia de processo acabou sendo desenvolvida em função dessa nova concepção de fechamento. Ocorreu, portanto, um processo inverso ao que é típico das indústrias dependentes de fornecedores, conforme mencionado antes, ou seja, a Brasilata realizou uma inovação radical de produto que gerou a necessidade de inovações de processo. Após todo esse esforço, a Brasilata passou a contar com um sistema de fechamento exclusivo que possibilita um desempenho superior, conforme análises realizadas pelo Centro de Tecnologia de Embalagem (Cetea)* e uma economia de 19 a 25% de material.

O sistema de fechamento plus para vasilhames de aço acaba de conquistar o selo Brasil Premium. O produto foi analisado e avaliado por técnicos do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), de São Paulo e outros profissionais, sendo depois julgado por um conselho deliberativo, com apoio da Câmara de Comércio Exterior e da Apex – Agência de Promoção de Exportações. Patenteado nos Estados Unidos e Europa (US5899352 e EP0706486), o produto quebrou um paradigma de mais de 90 anos, ao substituir o fechamento convencional, por atrito, por uma trava mecânica, oferecendo como vantagens, além da resistência três vezes maior à pressão interna (o que é muito útil nos processos críticos de envasamento e evita que as tampas sejam abertas no caso de uma queda), maior performance ante as quedas e facilidade de manuseio nas operações de abertura e fechamento. Além de marcar a primeira abertura no anel da tampa, este sistema abre e fecha mais facilmente várias vezes, evitando o ressecamento dos produtos. Com mais de 180 milhões de latas plus vendidas desde 1994, o produto, na opinião do diretor-superintendente da Brasilata, Antonio Carlos Teixeira, oferece melhor desempenho e produtividade nas linhas de enchimento das indústrias de tintas e produtos químicos. “Com esta inovação, o Brasil pode exportar tecnologia na produção de latas, invertendo a rota usual da globalização”, afirmou. 

Quem, afinal, foi responsável por esse desenvolvimento que quebrou um paradigma de mais de 90 anos? É difícil e, ao mesmo tempo, fácil de responder. Difícil se se quiser encontrar o nome de um inventor ou de uma equipe exclusiva, e fácil se considerarmos a prática da empresa. A Brasilata considera que todos os seus funcionários são inventores, tanto que novas idéias borbulham nas três etapas anuais do Projeto Simplificação. A empresa se considera um time que joga um jogo coletivo, e não individual. “Jogamos futebol e não tênis”, costuma dizer o diretor superintendente, “e num jogo de futebol o artilheiro não deve receber por gol marcado, senão quem jogaria no gol, quem faria o arremesso lateral?” Ao contrário do tênis ou de outro esporte individual, em que os pontos e as vitórias pertencem ao jogador, no futebol eles pertencem ao time. A recompensa em dinheiro é distribuída a todos os funcionários, conforme definido pelo seu sistema de participação nos resultados implantado em 1991.

O Fechamento Plus é uma invenção que só pode ser protegida pela patente, dada a possibilidade de imitação por meio de engenharia reversa. Inicialmente, quando a Brasilata resolveu a questão dos cantos vivos de aço nas bordas do anel entendeu que havia realizado uma modificação de forma em algo conhecido para conseguir melhor funcionalidade, enquadran-do-a, portanto, como um modelo de utilidade (MU), conforme a legislação de propriedade industrial, na época a Lei nü 5.772 de 1971, revogada pela Lei n.9.279, de 1996. Assim, foi depositado no INPI em 3 de maio de 1994 um pedido de modelo de utilidade (MU 7400485-9). A patente PI9408643 (depositada originalmente como modelo de utilidade MU7400485) refere-se a DISPOSIÇÃO CONSTRUTIVA EM LATAS COM GRANDE ABERTURA EXTREMA DE VAZAMENTO”, ditas latas apresentando uma parede superior (11) provida com uma abertura central (12) e uma sede de fechamento (12a) de onde projeta-se, para baixo, uma parede tubular (17) apresentando um extremo livre (18); uma tampa (20) apresentando uma borda periférica (21) assentável sobre a sede de fechamento (12a), sendo o extremo livre (18) da parede tubular (17) curvado para dentro da abertura central (12) e para cima até uma posição adjacente à dita parede tubular (17), definindo uma borda inferior de parede tubular na forma de uma nervura contínua (19). 

Posteriormente, diante de novas contribuições que levaram a criar uma nova concepção de fechamento, a Brasilata entendeu que deveria protegê-la em âmbito internacional, em face da constatação de que inventara algo radicalmente novo. Dadas as características do mercado internacional de latas de aço, entendeu-se que a proteção do novo invento deveria incluir os seguintes paises: EUA, Japão, Canadá, México, Áustria, Espanha, França, Inglaterra, Itália e China. A Áustria, embora sendo um mercado pequeno, foi incluída para poder alcançar proteção em outros mercados importantes, especialmente no Leste europeu. índia, Indonésia e outros com grande mercado não foram incluídos por apresentarem sistemas de patentes deficitários, que oferecem pouca proteção efetiva às patentes que concedem.

O início do processo de patenteamento do Fechamento Plus se deu por meio de um pedido internacional, conforme estabelece o Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT), aproveitando o prazo de prioridade de um ano estabelecido no art. 4tí da Convenção da União de Paris. Em 28 de abril de 1995 foi depositado no Inpi, a repartição receptora no Brasil de pedidos conforme o PCT, um pedido internacional no Escritório Internacional da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Ompi), reivindicando direitos de prioridade sobre o MU 7400485-9 e indicando como países designados os antes mencionados (PCT/BR 95/ 00027). O pedido brasileiro foi necessário modificar as reivindicações e apresentar aos examinadores brasileiros os documentos apresentados ao US Patent Office referentes às vantagens do fechamento por travamento mecânico. Em 19 de outubro de 1999 o Inpi finalmente deferiu o pedido, concedendo o privilégio de patente a invenção da Brasilata depois da via-crúcis iniciada em 1994 com aquele pedido de modelo de utilidade já comentado. Vale mencionar que a patente européia já havia sido concedida em 25 de novembro de 1998 (EP 0706 468 Bi) e a patente Argentina em 12 de outubro de 1997 (patente n. 251361). 

A Brasilata iniciou a produção de latas redondas para tintas com Fechamento Plus de 0,9 e 3,6 litros em 1996, tendo produzido desde aquela época, até março de 2002, mais de 200 milhões de unidades e economizado cerca de 4 mil toneladas de aço, equivalentes a mais de US$ 2 milhões. Além disso, a empresa pretende iniciar uma nova era, na qual passem a constar também em sua receita royalties referentes ao licenciamento desta e de outras invenções e modelos desenvolvidos por ela. O primeiro contrato de licenciamento foi assinado cm março de 2000, com a empresa Renda do Recife, e inclui, além da licença para uso, o fornecimento dos próprios componentes (tampas e anéis plus). Em abril de 2003 a Brasilata assinou com o Grupo Zapata, o maior fabricante mexicano de latas de aço, o seu primeiro contrato de licenciamento internacional. 

A Brasilata resolveu dar os primeiros passos visando um licenciamento internacional somente após a concessão da patente norte-americana em maio de 1999. E decidiu iniciá-lo pelo mercado norte-americano, não só por ser o maior mercado de embalagens de lata de tintas, mas também porque as latas no Brasil e nos EUA possuem especificações semelhantes, o que facilita a implantação da inovação. Na Comunidade Européia as latas apresentam dimensões diferentes e há uma grande diversidade de formatos vigentes nos países que compõem esse bloco econômico. Assim, considerando cada país europeu isoladamente, o mercado é relativamente pequeno. Por exemplo, o mercado do Reino Unido, onde as dimensões e formas das latas se aproximam das vigentes no Brasil, significa menos que a metade do brasileiro. 

A estratégia para alcançar o mercado norte-americano tem sido oferecer aos fabricantes locais de latas tanto o licenciamento, mediante a cobrança de royalties, quanto a venda de componentes produzidos no Brasil. Após a aprovação da patente pelo Usplo apareceram duas novas dificuldades: uma relativa ao preço e a outra à exclusividade. Esta última tem sido a mais difícil de resolver. Em princípio a Brasilata não pretende licenciar com exclusividade, para não restringir o mercado. A exclusividade só faria sentido se fosse possível obter uma remuneração adequada, o que em última análise significaria a venda da patente, hipótese recusada pelos fabricantes locais. Com o prolongamento das negociações, a Brasilata optou por nomear um representante local, um técnico com muita experiência no setor de latas, para facilitar as negociações e reduzir os custos de viagens.

Atualmente a empresa estuda como alternativa oferecer o produto diretamente aos fabricantes americanos de tintas. Além disso, vários contatos foram feitos com fabricantes de latas do Reino Unido, França, Itália, Grécia, Turquia, Arábia Saudita, Indonésia, Tailândia, Coréia, Austrália, Chile, México, Colômbia e Venezuela. Esse interesse se deve à projeção que o produto patenteado obteve nos certames internacionais, conforme já mencionado. Com a demora nas negociações com fabricantes dos EUA, o primeiro licenciamento internacional acabou por ocorrer no México, onde a negociação fluiu muito mais rápida, facilitada pela semelhança de cultura. A negociaçao envolveu tanto o recebimento de ToycdUes pelo uso da patente como a venda dos componentes (anéis e tampas), cujo primeiro embarque para o México foi feito em dezembro de 2002. A Brasilata acredita que um eventual sucesso do Fechamento Plus no mercado mexicano deverá estimular as negociações atualmente em curso nos mercados americano e canadense. No caso da negociação da licença para as economias do Primeiro Mundo poderá ser apresentada uma outra possibilidade interessante de negócio. Em razão das fortes vantagens competitivas apresentadas pela indústria siderúrgica local, o aço brasileiro tem sido fortemente penalizado, quer por sobretaxas, quer pelo estabelecimento de cotas, especialmente nos EUA e na Comunidade Européia. Considerando que os componentes plus incorporam tecnologia patenteada, a Brasilata acredita que será possível a sua exportação como produto final, isto é, como aço processado com aquelas vantagens já mencionadas, escapando, dessa forma, das penalizações impostas ao aço in tintura.

A Brasilata é a maior produtora de latas de aço para tintas do país, mas não seria um exagero dizer que a empresa é na verdade uma fábrica de idéias. Com 32 patentes de produtos, sendo seis registrados mundialmente, a companhia se prepara para entrar no mercado americano e faturar com a venda de tecnologia. A empresa começou a desenvolver em 1994 o sistema de fechamento de tampas de latas de tintas que não recebia uma inovação há mais de 90 anos, chamado plus. As tampas foram aperfeiçoadas até a Brasilata chegar, no fim de 2000, ao sistema biplus, destinado ao mercado de tintas coloridas nos pontos de venda. A economia de matéria-prima e a praticidade na abertura e fechamento das latas foram as grandes vantagens obtidas com as inovações. As invenções fizeram a Brasilata dobrar de tamanho em dez anos. A empresa, que processava 20 mil toneladas de aço em 1990, passou a produzir 40 mil toneladas em 2000. Sua participação de mercado aumentou de 19% para 35% em apenas cinco anos. Mas o grande incremento ainda está por vir: O produto está em teste no mercado nacional, mas nosso alvo é os Estados Unidos, diz Antonio Carlos Teixeira, diretor superintendente da Brasilata. 

A empresa já deu seu primeiro passo para conquistar seus objetivos. Fechou um acordo de transferência de tecnologia com o grupo Zapata. Além dos royalties pelo produto, a Brasilata também vai exportar para a companhia mexicana as tampas das latas. A produção da Zapata deve chegar aos EUA e testar o mercado local. Teixeira espera apenas os resultados da recepção ao seu produto para dar o próximo passo: uma das alternativas é montar uma fábrica no México, diz o executivo. A outra seria faturar com royalties da transferência de tecnologia para parceiros americanos. Mas a Brasilata não vai restringir seus planos de expansão aos EUA. A patente das tampas da companhia também estão registradas em vários países da Europa e Ásia, que devem passar a ser próxima meta da produtora de embalagens, assim que estiver definida a entrada na América do Norte. Segundo Teixeira, o problema na Europa é que os diâmetros utilizados pelas fabricantes européias são diferentes dos padrões brasileiros e americanos. Porém, algumas companhias já estão em contato com a Brasilata e cogitam a hipótese de alterar seus diâmetros para testar a inovação nacional. 

A Ásia é outra região onde muitas empresas estão entrando em contato com a Brasilata para conhecer melhor o sistema plus de fechamento. A companhia ficou conhecida na região depois de ganhar o prêmio Ouro para o segmento de latas para tintas no torneio Internacional Cans of the Year´2000, realizado em Brisbane, Austrália. Em 2003, a empresa deve se aproximar ainda mais do Oriente, quando vai participar de uma feira mundial do setor que será realizada em Cingapura. Mas nem só de tintas vive a Brasilata. No ano passado, 25% de seu faturamento de R$ 145 milhões veio da venda de latas para o setor de alimentos. É neste segmento que a companhia projeta agora sua grande expansão, baseada também em uma nova embalagem para produtos alimentícios em pó. 

O Fechamento Ploc Off é outro membro do pacote PJus. Trata-se de uma adaptação da tampa plástica do Fechamento Biplus, para embalagem de produtos alimentícios em pó. Essa adaptação proporciona uma vedação mais simples e, ao mesmo tempo, conserva melhor os alimentos após a primeira abertura que os sistemas de fechamento tradicionais. Essa embalagem recebeu o prêmio Embanews Tecnologia, no início de 2001. A Brasilata acredita que, em vez de uma simples extensão de linha essa solução possa vir a ser uma outra inovação radical do tipo B, na medida em que, dependendo da aceitação do consumidor, mude a base de competição no mercado de embalagem de produtos alimentícios em pó (leite, café, chocolate etc).

A Ploc Off está em seus últimos testes para entrar no mercado. A inovação, também neste caso, foi na tampa da embalagem, que vai dispensar o lacre de alumínio e uma parte significativa dos custos. A embalagem também já está patenteada nos maiores mercados mundiais. Essas patentes internacionais, porém, não são as únicas da Brasilata. A empresa ainda está desenvolvendo outros produtos, que são mantidos em sigilo, mas que já estão patenteados. A cada patente, registrada em 30 países, a empresa investe US$ 100 mil, isso sem contar a aplicação de 1,5% do faturamento anual em pesquisa e desenvolvimento. Somos 900 inventores, diz Teixeira sobre sua equipe, que no ano passado teve mais de 2,5 mil idéias sobre melhoramentos em produtos e processos. A Brasilata é uma das empresas mais premiadas nesta década, relatou Alvares. “O setor é maduro, a primeira lata foi criada em 1811, mas a Brasilata nunca deixou de pensar em inovações, sempre almejou trazer benefícios para as industrias e usuários. E por isso é uma das empresas mais premiadas na década de 90 como melhor fornecedor de embalagens de latas de tintas”.

O mercado brasileiro de tintas estimado em US$ 1.8 bilhões dominado por multinacionais como a ICI, Sherwin Williams, Akzo Nobel e Basf que detém 50% do mercado, sendo o restante pulverizado por diversos fabricantes locais nacionais. Cerca de 95% do mercado é de latas de aço, sendo as latas de plástico com um papel marginal no mercado. Dos fabricantes nacionais a Brasilata é o maior produtor com três fábricas e cerca de 900 empregados. Fundada em 1955 e instalada em São Paulo a empresa imediatamente focou seus esforços em projetos originais ao invés de seguir a rota convecnional de seus competidores. No últimos 10 anos elevou sua produção para 70 milhões de latas. Sua ênfase em inovação a distingue das demais fabricantes nacionais. Todas suas três fábricas possuem certificação ISO9002 e seus produtos recebidos vários prêmios. Competidores como ICI e Sherwin Williams rapidamente adotaram a tecnologia desenvolvida pela Brasilata. O sistema Biplus foi desenvolvido em conjunto com a ICI. 

De que maneira a Brasilata conseguiu transpor as barreiras de um setor dominado por fornecedores e se transformar numa empresa inovadora e criadora de novas tecnologias? A resposta parece estar no estilo participativo de gestão adotado pela empresa, que estimula a criatividade e o compromisso dos seus funcionários. A pesquisa efetuada encontrou evidências claras de que o desempenho diferenciado dã Brasilata em termos de inovação está no seu modelo de gestão, que valoriza os seus funcionários. Foi muito importante o apoio inicial dado pelos principais clientes, com os quais a Brasilata sempre procurou manter um relacionamento de longo prazo. Assim, por exemplo, no caso do desenvolvimento do Fechamento Pina para latas redondas para tintas, fundamental foi a parceria desenvolvida rum as Tintas Coral, braço brasileiro da multinacional IO, que estimulou o desenvolvimento inicial e, na medida em que o produto foi aprovado, comprou Ioda a produção durante o primeiro ano. 

A Brasilata a partir de 1987, com as demandas de originárias de técnicas japonesas entre os quais o kanban e o just-in-time, surgiu o Projeto Simplificação, e abriram-se os canais de comunicação entre os empregados da empresa. O Projeto de Simplificação é um canal formal para a apresentação de idéias que contribuiu para milhares de mudanças internas, sendo a maioria de inovações em processos, embora algumas tenham resultado em novos e vitoriosos produtos. O funcionário é estimulado a apresentar idéias, em grupo ou isoladamente, que possam melhorar o produto ou o processo, administrativo ou operacional, recebendo uma premiação após a aprovação da idéia. Em 1999 enquanto forma recebidos 0,9 idéias por funcionário, este número saltou para 31,8 idéias por funcionário em 2003, enquanto que em termos absolutos o número total de idéias recebidas no mesmo período saltou de 834 para cerca de 30 mil. O projeto se realiza em duas etapas anuais, nas unidades e uma anual, chamada de Supercopa, em que são reunidas as melhores idéias de todas as três unidades da empresa (São Paulo, Rio Grande do Sul e Goiás), que competem entre si. Os prêmios não raro são ganhos por equipes formadas por cinco ou mais pessoas, nas quais o primeiro idealizador desenvolve sua idéia com ajuda do mecânico, do eletricista, dos operadores de máquinas, etc. Mesmo as idéias não aproveitadas são recompensadas, ainda que de modo simbólico, e consideradas um investimento pela Diretoria da Brasilata. Pelo seu sistema de gestão partcipativa a Brasilata foi vencedora do Prêmio Finep Grande Empresa de 2008. 

Fonte: 
http://www.quimica.com.br/revista/qd404/embalagens1.htm
 
http://www.brasilata.com.br/pt/index_pt.php?Id=Pro01A
 
http://www.finep.gov.br/bv/noticias/brasilata.htm
 
http://www.mundocor.com.br/fechamentoplus.htm
 
acesso em dezembro de 2002
http://www.mundocor.com.br/premio_australia.htm acesso em março de 2003
http://www.apeal.org/Contents/Base07.html
 
acesso em maio de 2005
http://www.mbc.org.br/mbc/pgqp/hot_sites/congresso_2006_php/palestrantes.php
acesso em abril de 2009
 
JORNAL GAZETA MERCANTIL DATA: 11/05/2005 ON LINE Registro – Lata premiada
 
Revista Exame 28/9/2006 – As 10 melhores inovações brasileiras
 
Organizações Inovadoras:estudos e casos brasileiros,José Carlos Barbieri, Rio de Janeiro:FGV, 2003
 
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