Gastão Galhardo Madeira nasceu na cidade de Ubatuba, do Estado de São Paulo, aos 20 de junho de 1869, sendo filho legítimo de Joaquim José Lázaro Madeira e Maria Angélica de Galhardo Madeira. Aos dois anos de idade, sua família mudou-se para São Luiz do Paraitinga, de onde se mudou para Guaratinguetá, e depois para Caçapava, vindo afinal a fixar residência definitiva na Capital, quando Gastão contava doze anos. Já nessa época, o jornal A Província de São Paulo dera uma pequena notícia referente à sua propensão para as invenções. Em 1888, aos 19 anos, quando estava por terminar os preparatórios, preocupou-se com o voo das aves, observando-as demoradamente com o intuito de descobrir as suas leis e aplicá-las ao voo humano. Ao fim de um biênio, satisfeito com as suas pesquisas, redigiu um manuscrito sobre a teoria da locomoção aérea e requereu no dia 24 de julho de 1890 patente de invenção para um “novo aeróstato dirigível”, obtida em 19 de agosto, conforme se vê do Diário Oficial da União. De posse da patente o jovem Gastão Madeira foi ao Rio de Janeiro, onde entregou, no dia 24 de agosto, o seu manuscrito sobre a direção dos aeróstatos ao Sr. Fernandes Pinheiro, do Clube de Engenharia.
A concepção de Gastão inclinava-se para o problema do mais pesado, embora com a forma de aeróstato e com emprego de gás para aliviar o peso, pois os motores da época, elétricos, eram pesadíssimos; o motor de explosão, leve e poderoso, só surgiria algum tempo depois. O teor da conferência, realizada no Clube dos Engenheiros, era a dirigibilidade dos aeróstatos. Na ocasião, o inventor expôs detalhadamente os meios mecânicos de pôr essa ideia em prática, dizendo que o aeróstato seria de forma alongada (invenção anterior, original de Júlio César, Aero visão nº 40), faria o deslocamento do centro de gravidade por meio de pesos móveis e teria como propulsor uma hélice. Gastão Madeira intuía fazer conferências no Clube de Engenharia e no Instituto Politécnico Brasileiro também, mas, ao que se saiba, só obteve audiência no primeiro. Partiu no dia 4 de setembro de 1890 para São Paulo; antes pedira ao Ministro da Agricultura para mandar fazer seu aparelho nas oficinas do Arsenal de Marinha; nisso, porém, ele não seria atendido. Passado algum tempo, depois de haver solicitado constantemente notícias do manuscrito deixado em poder do Clube de Engenharia, o recebeu, decorridos muitos meses, amassado e estragado pelas traças, desacompanhado de todo e qualquer parecer.
Em 1901 Santos Dumont conquistou o Prêmio Deutsch, conferido àquele que provasse praticamente a dirigibilidade dos balões. Em 1904 Zepelim inventou o dirigível rígido, dando início à industrialização dos mesmos e em 1906 Santos Dumont conquistou a Taça Archdeacon e o Prêmio do Aeroclube de França para quem efetuasse um voo mecânico. Em 1908, Farman ganhou o prêmio Deutsch-Archdeacon na França ao realizar um voo de um quilômetro em circuito fechado. Em 1909, Blériot atravessou do Canal da Mancha. Concomitantemente às conquistas gloriosas que estavam sendo realizadas, tragédias também ocorriam. A instabilidade dos aparelhos aéreos da época era a principal responsável pelo elevado índice de mortes de pilotos.
Em 1911 Gastão Madeira ideou um dispositivo para assegurar aos aviões maior estabilidade de equilíbrio, a fim de evitar os contínuos desastres da época. O Dr. Hilário Freire auxiliou-o nos estudos do invento e ambos o patentearam, sob a denominação de “aviplano”. No dia 1 de novembro do dito ano os inventores, no Rio de Janeiro, fizeram uma exposição e uma demonstração de seu aparelho ao Presidente da República, no Palácio do Catete, que tão impressionado ficou que os autorizou a dirigirem ao governo um memorial expondo de que modo o mesmo poderia prestar-lhes auxílio.
A invenção foi amplamente divulgada pela imprensa da época. A Confederação Aérea Brasileira, recém-fundada, tomando conhecimento dos trabalhos de Gastão Madeira, aclamou-o no mês seguinte seu sócio efetivo. Com os grandes progressos da aviação, entretanto, Gastão Madeira percebeu que o aviplano logo se tornaria obsoleto. Assim, passou a estudar o problema sob outro ponto de vista e inventou um dispositivo de peças móveis para assegurar a estabilização automática dos aeroplanos. Construiu alguns modelos e os ofereceu em 1913 a uma comissão de professores da Escola Politécnica de São Paulo para análise, comissão essa composta pelos Drs. Theodoro Ayrosa, Achilles Nacarato, Marino Wately e Gentil de Moura, que emitiram parecer favorável ao invento. Foi enviado então ao Presidente do Estado, Dr. Altino Arantes, um relatório explicativo.
Resolvido a tornar sua invenção realidade, Gastão Madeira pleiteou ao governo do Estado, ainda em 1913, auxílio para uma viagem à Europa, onde contrataria uma firma para construí-la. Os poderes públicos interessaram-se pelo assunto e, assim, promulgou-se um decreto de 30 de dezembro de 1913, iniciativa do Senador Almeida Nogueira, concedendo “ao bacharel Gastão Madeira passagem para a Europa e a assistência anual de 18:000$000, em dois exercícios, para experiências definitivas de um novo tipo de aeroplano, de sua invenção”. Em abril de 1914 Gastão Madeira partiu com os modestos recursos de que dispunha para a França, onde se fixou. Apesar das perturbações da Grande Guerra e de haver então mais de 37.000 invenções em estudos pela técnica francesa, ele conseguiu obter quatro patentes: a primeira, para um “aparelho de divertimento que dá a ilusão do voo”, foi requisitada no dia 13 de junho de 1914 e concedida em 24 de novembro do mesmo ano; a segunda, para o “dispositivo assegurador da estabilização automática de aeroplanos e análogos”, foi solicitada no dia 11 de julho de 1914 e concedida em 22 de janeiro de 1915; a terceira, para “anúncios luminosos comandados por uma porta em forma de cilindro” foi solicitada em 15 de dezembro de 1915 e concedida em 9 de maio de 1916; finalmente, a quarta e última, para um “dispositivo de comando de governo do profundor de aeroplanos e outros aparelhos aéreos”, foi solicitada no dia 3 de maio de 1916 e concedida em 19 de fevereiro de 1919, quando ele já havia regressado ao Brasil.
Mais tarde, foi obtido o registro da patente na Alemanha, Itália, Inglaterra e Estados Unidos. Executadas as providências preliminares, Gastão iniciou a procura do construtor que iria concretizar seus sonhos. As fábricas consultadas recusaram-se, pois teriam que modificar suas linhas de produção e a França já estava envolvida pela guerra. Com os recursos quase esgotados, Gastão resolveu oferecer, sem perda dos seus direitos, o invento ao governo francês para ser utilizado durante a guerra. O inventor alimentava a esperança de que o governo determinasse a construção imediata à custa do Estado. O governo aceitou o oferecimento e pediu as plantas e descrições, imediatamente enviadas por Gastão, que ainda se dispunha a fazer todas as demonstrações teóricas. No entanto, as perturbações da guerra acentuaram-se e a censura o impediu de saber o destino dos documentos ou de qualquer deliberação que houvesse sido tomada. Depois de muito procurar, Gastão vem a saber que toda a documentação tinha desaparecido, o que, felizmente, não afetava os seus direitos. Finalmente, seu invento é julgado favoravelmente, mas o governo exige a apresentação do aparelho definitivamente construído para experiências.
Achando-se quase esgotado o auxílio recebido, Gastão Madeira fez ao governo do seu Estado as devidas comunicações, por intermédio do ministro brasileiro em Paris, Dr. Olinto de Magalhães, demonstrando a impossibilidade financeira de execução do invento e pedindo os necessários recursos para as despesas preliminares. O senador Dr. Freitas Vale apresentou ao Congresso um projeto de concessão de um auxílio de 50 contos de réis, sobre o qual o então Secretário da Fazenda, Dr. Cardoso de Almeida, deu parecer desfavorável, em virtude das más condições econômicas do Estado, como consequência da guerra. Foi esse fato que motivou o chamado de regresso por parte do senador Dr. Cândido Rodrigues. Consequentemente, não lhe sendo mais possível permanecer com a sua família na França, Gastão Madeira viu-se forçado a regressar à pátria, o que fez em 1917. E como não dispusessem de meios para pagar as anuidades dos privilégios obtidos na França, na Inglaterra, na Itália e nos Estados Unidos, todas as suas patentes caducaram. O inventor nunca soube se as suas ideias foram ou não aproveitadas.
Em 1927, Gastão Madeira teve a consolação de ver o seu nome figurar, ao lado de Bartolomeu de Gusmão, Santos Dumont e outros brasileiros insignes da aviação, na placa de ouro comemorativa da travessia do Atlântico, realizada pelo comandante João Ribeiro de Barros [1900 – 1947] no dia 28 de abril do dito ano, a bordo do Jahu. Passados dez anos, no mês de outubro de 1937, Gastão Madeira foi homenageado durante as festas do III Centenário da Fundação de Ubatuba, realizadas nos dias 28, 29 e 30. Quase septuagenário, ele estava afastado do seu berço natal desde os dois anos de idade e ali só retornou a convite do Instituto Histórico e Geográfico, que teve a feliz iniciativa de homenageá-lo com uma placa de bronze na casa em que ele nasceu, placa essa que continha sua efígie, trabalho do escritor Vicente Larocca. No dia 6 de maio de 1940 Gastão Madeira foi eleito sócio honorário do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. Registre-se que a honra de sócio honorário só era concedida aos sócios em circunstâncias especiais e aos não sócios quando estes revelassem excepcional merecimento. Foram os trabalhos teóricos de Gastão Madeira sobre aeronáutica publicados em 1892 que lhe valeram essa elevada distinção. O inventor faleceu a 4 de agosto de 1942; menos de dois anos antes, ainda registrava o “Novo tipo de hélices para aeroplanos, hidroplanos, dirigíveis e semelhantes”, o que demonstra o esforço e tenacidade com que lutou, até o último momento, pelas suas ideias.
Em 1937, nos eventos comemorativos do tricentenário de Ubatuba, Gastão Madeira foi homenageado pelo Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, com discursos, placa de bronze, solenidades, etc.; e homenageando a cidade, foi publicada a Revista XXVII – 1938, que alguns possuem e disponível na Biblioteca Municipal, há um exemplar fotocopiado. Acontece que quase a totalidade da população de Ubatuba e vários estudiosos ligados à cultura não tomaram conhecimento da “Separata da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, Volume XXXVII – Gastão Madeira, Pioneiro da Aviação – São Paulo – 1939”. Segundo Luiz Carlos Lima: “Esta obra é fundamental para se compreender as ideias deste estudioso, pioneiro da aeronáutica, nascido em Ubatuba”. Vamos aproveitar as homenagens a Gastão Madeira que estão sendo preparadas, para efetivar o processo de reedição, e que cada Escola e Biblioteca do município tenham um exemplar, para que todos os alunos e todos os cidadãos de Ubatuba conheçam e admire este grande brasileiro
Fonte:
http://www.ubatubasp.com.br/gast%C3%A3o.htm (Jornal Ubatuba em Revista, Ed. 23, ano I, 23/04/95)
http://www.fundart.com.br/antigo/gshistgeo/gasmadeira.html
Acesso em agosto de 2003
Agradeço a contribuição do pesquisador Rodrigo Moura Visoni (rmvisoni@yahoo.com.br) por ter enviado material para composição desta página em agosto de 2003 e a Luiz Carlos Lima (arqluizcarloslima@ig.com.br) pela revisão da página em outubro de 2005