O látex natural da seringueira (Hevea brasiliensis) contém substâncias que podem ser usadas na confecção de próteses para recuperar vasos sanguíneos e apresenta vantagens em relação a outros substitutos até então adotados. Isso é o que mostram pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Sob supervisão dos médicos Jesualdo Cherri e Joaquim Coutinho-Netto, o cirurgião vascular e cardiovascular Mário Augusto da Silva Freitas estudou em seu doutoramento aplicações do látex no sistema arterial. O estudo é inédito por usar um material biológico de origem vegetal na confecção das próteses, em vez de materiais sintéticos ou biológicos derivados de animais e mereceu o prêmio “Rio Park”, do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, dedicado ao melhor trabalho experimental com aplicação clínica, entregue no último Fórum de Pesquisa em Cirurgia.
As artérias são tecidos de difícil substituição, com poucas alternativas de fontes doadoras no próprio organismo. Próteses sintéticas, o pericárdio bovino e vasos de cadáveres preservados congelados são os substitutos mais comumente adotados. Um diferencial da prótese extraída do látex é a capacidade de reproduzir a elasticidade das artérias, fator importante sobretudo nas linhas de sutura. Esse material é também mais resistente a infecções. “Ele comporta-se bem em tecidos infectados, ao contrário das próteses sintéticas”, diz o médico. “Além disso, apresenta custo mais baixo e grande disponibilidade em nosso meio.”
Modificações nas propriedades biológicas do látex foram necessárias para seu uso no corpo humano. A transformação envolveu filtragem, adições químicas e a forma de vulcanização do material. O resultado é um composto diferente dos atualmente usados em aplicações industriais (luvas, pneus etc.). “O látex foi diferenciado justamente para permitir implantes biológicos com boa aceitação”, comenta Freitas. A pesquisa de laboratório nasceu de uma observação na natureza. Os cientistas descobriram que o látex é uma defesa da planta. A seiva que a seringueira solta é, na verdade, um cicatrizante natural. Para uso na medicina o látex é misturado com outras substâncias. O resultado é um material com micro poros. Exatamente como a pele humana. “São fatores de crescimento muito parecidos, quase que um alto grau de identidade, com os fatores de crescimento dos hormônios cicatrizantes do homem”, diz o pesquisador da USP Coutinho Neto. O material também é usado para restaurar tecidos danificados como a membrana do tímpano.
O modelo vascular foi desenvolvido a partir de 1997. Foram realizados testes em que próteses de látex foram implantadas em artérias das virilhas de doze cães e comparadas com veias dos próprios animais inseridas em outro membro. Cerca de três meses depois, os médicos constataram boa regeneração dos tecidos sobre as próteses, o que indica compatibilidade do látex no sistema arterial de cães. “Não é um sistema arterial idêntico ao do homem, mas, além de apresentar similaridades, é aquele que oferece maior quantidade de dados para comparações”, explica Freitas.
A substância extraída do látex, que se tornou a matéria prima das próteses desenvolvidas por Freitas, foi pesquisada ao longo dos últimos seis anos pelo professor Joaquim Coutinho-Netto, do Departamento de Bioquímica e Imunologia da FMRP. Obtida com modificações na vulcanização do látex, ela possui características “cicatrizantes”, acelerando a reconstituição dos tecidos. A descoberta só tornou-se viável com a colaboração dos setores de pesquisas básicas e Clínica da FMRP. Além de Coutinho-Netto, Freitas contou com o apoio dos professores Jorge Elias Jr., da disciplina de Radiologia, João José Lachat e José Antônio Thomazini, da disciplina de Anatomia.
O látex foi aplicado pela primeira vez em seres humanos em 1998, na reconstituição de tímpanos destruídos por infecções crônicas. Segundo Freitas, pesquisas devem continuar a explorar novas aplicações para o composto. No entanto, é preciso também conhecer as limitações do produto. “Caso haja investimentos, encontraremos várias aplicações para o látex”, acredita o médico. “Por enquanto, ele está sendo usado em membranas timpânicas e úlceras dos membros inferiores. Existem ainda pesquisas em desenvolvimento em parede abdominal, dura-máter (invólucro do cérebro) e pericárdio (invólucro do coração).”
O material descoberto totalmente por acaso, como assume um de seus criadores, Joaquim Coutinho Netto, do Departamento de Bioquímica e Imunologia da FMRP (Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto). No começo, ele e sua então aluna de mestrado Fátima Mrué buscavam recriar uma prótese para esôfagos feita à base de silicone e colágeno. As tentativas não deram lá muito certo: os materiais não se misturavam de jeito nenhum, graças a algum segredo industrial muito bem guardado pelos cientistas japoneses que a desenvolveram. Coutinho decidiu substituir o silicone por látex, achando que a mistura aconteceria de forma mais fácil. A dupla encomendou ao químico Antônio César Zabrowski, de uma empresa fabricante de borracha na região de São José do Rio Preto, a fabricação do tubo que serviria de prótese. Usando látex vegetal e 0,1% de colágeno, Zabrowski criou o modelo, que foi implantado em cães. A princípio, tudo parecia ter dado errado: depois de dez dias, o tubo de látex saiu junto com as fezes dos bichos. Ao examinar o que acontecera por meio de uma endoscopia, veio à surpresa: um novo esôfago havia se formado no lugar do que havia sido cortado.
Depois de muito investigar o mistério, Coutinho hoje tem uma ideia do que acontece: “O látex estimula a angiogênese [a formação dos vasos sanguíneos]”, afirma. Não adianta, contudo, sair por aí cortando camisinhas para usar como esparadrapo: só o látex preparado de acordo com o método de Zabrowki, que o patenteou e vendeu à Pele Nova Biotecnologia, é capaz de manter as propriedades que estimulam a cicatrização. Hoje, o biomaterial é polvilhado sobre a ferida, e Coutinho imagina que ele libere uma substância muito parecida com o vegf (fator de crescimento vásculo-endotelial) – reconstruindo veias e artérias e levando combustível para que o local do ferimento se refaça. “É como se fosse uma guerra: primeiro se leva comida para frente de batalha”, compara o pesquisador. Parece um belo golpe de sorte achar uma substância assim numa seringueira, mas Coutinho sugere que é melhor agradecer à evolução: “As seringueiras são plantas superiores [muito complexas evolutivamente]. Além dos dois tipos de seiva que as outras plantas têm, essas árvores também possuem o látex, que parece ajudar a reconstituir os tecidos delas. E ele parece conseguir desempenhar a mesma função em nós”, especula o pesquisador.
Com todos esses fatores a favor, alergias ao material definitivamente não foram um problema. “Se muita gente fosse alérgica a látex, você já imaginou quantas pessoas teriam de ir ao urologista ou ao ginecologista por causa de camisinhas?”, brinca Coutinho. Os testes começaram em pessoas com úlceras de difícil cicatrização nas pernas, um problema comum em muitos diabéticos. O biomaterial também foi testado em membranas dos tímpanos e no pterígio, a membrana que recobre a córnea dos olhos. O sucesso tem sido animador, de acordo com o cientista da USP: “A ferida fecha centripetamente [das bordas para o centro], sem deixar cicatrizes”, afirma. Até agora, todos os casos mostraram uma formação vigorosa e sadia de novos vasos sanguíneos, embora a formação de pele sobre o local atingido ainda dependa do potencial de cicatrização de cada pessoa, que pode variar de acordo com a idade ou outros fatores. Além de ser bom para as feridas, o curativo de látex deve beneficiar também o bolso: por ser produzido no Brasil com material relativamente barato, estima-se que ele custe pelo menos dez vezes menos que os similares produzidos por grandes empresas farmacêuticas internacionais, que usam métodos bem distintos. “O apelo comercial e de marketing do produto é certamente interessante”, diz Coutinho.
De 1998 a 2000, este material bioativo e indutor de angiogênese passou a ser utilizado em alguns hospitais, de forma bem sucedida, no tratamento de pacientes portadores de feridas crônicas de causas diversas. Em 2002, os caminhos da dupla cruzaram-se com os da Academia Brasileira de Estudos Avançados Dr. Adolfo de Bezerra de Menezes Cavalcanti, uma organização não governamental (ONG) mantida pela empresa Avamax Biotecnologia, que tem entre seus membros o ex-presidente da Embraer e da Varig Ozires Silva. A entidade visa financiar iniciativas de ponta e projetos nas diversas áreas da ciência e que, direta ou indiretamente, contribuam para a melhoria da qualidade de vida da sociedade e para a sustentabilidade do desenvolvimento nacional. Para isso, busca recursos de financiamento em fontes públicas e privadas. Este encontro permitiu, não só o conhecimento do mérito científico da descoberta como também a análise de sua viabilidade econômica por parte de uma plateia de cientistas e investidores que compreenderam as inúmeras aplicações clínicas do material, além da utilização no tratamento de feridas. Daí à criação de uma indústria nacional para produção e comercialização do primeiro produto em base da tecnologia biomembrana®, foi questão de um ano e em 2003 nasceu a Pele Nova Biotecnologia S/A . Em 2004 BIOCURE®, a primeira aplicação prática da biomembrana® – tecnologia patenteada em mais de 60 países – torna-se disponível a profissionais de saúde após aprovação de registro de comercialização pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
“Visitei todos os sócios da Associação Brasileira de Capital de Risco”, relembra Ozires Silva. Ao fim de oito meses, onze investidores haviam sido convencidos da viabilidade do projeto, sendo quatro empresas de investimento e os demais investidores pessoais, incluindo o próprio Silva, que detém 6% do empreendimento. Os pesquisadores envolvidos no projeto também receberam cotas de participação no capital. Agora, com os R$ 10 milhões recebidos dos investidores e depois de sete meses de trabalho, a Pelenova – o nome recebido pela companhia – está pronta para mostrar seu primeiro produto comercial: o Biocure. “Fazemos a ponte entre os cientistas e os investidores, para mostrar produtos com potencial em disputar o mercado”, explica Ozires, que já promoveu várias reuniões entre o coordenador do projeto, o médico Joaquim Coutinho Netto, do Departamento de Bioquímica e Imunologia da FMRP, e interessados em conhecer em detalhes o novo produto. O objetivo desses encontros, dos quais já participaram inclusive investidores da Alemanha e da Itália, é captar os recursos necessários para montar a unidade piloto e a industrial. A planta piloto, prevista para começar a funcionar no próximo mês de julho em uma antiga fábrica de industrialização de palmito pertencente à Avamax, foi projetada de acordo com os critérios exigidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A industrial será instalada no distrito industrial de Ribeirão Preto, idealizado pelo ministro da Fazenda, Antônio Palocci, na época em que era prefeito da cidade.
O biopolímero, que inicialmente será lançado para tratar úlceras crônicas de pés e pernas, vai concorrer com outros de grandes multinacionais, como Johnson e Novartis. Segundo Coutinho, as fórmulas são diferentes, mas os resultados, idênticos. “Sem contar que o tratamento com o nosso produto custará, pelo menos, dez vezes menos”, afirma. “Uma bisnaga de 15 gramas de um cicatrizante à base de gel com hormônio humano custa US$ 350 e dá para apenas poucos dias”, compara Coutinho. A trajetória que levou a essa biomembrana teve início em 1994, quando a então estudante de mestrado da Área Cirúrgica da FMRP Fátima Mrué, uma goiana que passou dois anos em Tóquio, no Japão, acompanhando cirurgias de pacientes com câncer, resolveu trabalhar em sua tese com a prótese de Takimoto, que leva o nome do médico inventor, composta de silicone e colágeno e utilizada para reconstituir esôfagos. Fátima procurou Coutinho para saber como obter colágeno da pele de porco, técnica descrita em um artigo publicado na década de 60 e que seria utilizada na confecção da prótese.
Hoje, Coutinho diz que não imaginava que aquela simples pergunta sobre o colágeno o conduziria a reuniões semanais com interessados em investir no biopolímero. Afinal, para se ver livre da estudante na ocasião – hoje Fátima Mrué é cirurgiã do Centro de Oncologia do Hospital das Clínicas de Goiânia -, Coutinho disse a ela que, se encontrasse o artigo, poderia ajudá-la na empreitada de fazer uma prótese semelhante à de Takimoto. “Tarefa muito difícil e demorada para a época, já que não havia a Internet”, como ele mesmo relembra. Dois dias depois, a surpresa. Fátima voltou com o artigo nas mãos. Coutinho, resignado, resolveu ajudar a persistente aluna na preparação do colágeno da pele de porco. Mas, ao ser misturado ao silicone, não houve jeito de fazer com que os dois materiais se unissem. “Não conseguimos reproduzir a prótese japonesa”, relembra Coutinho. “Takimoto não contou em sua patente como fazia para fixar o colágeno na prótese.” Fátima ainda entrou em contato com o médico japonês para pedir ajuda, mas ele não revelou o bem guardado segredo.
“Foi quando tive a ideia de fazer a prótese com o látex de seringueira”, relata o médico, inspirado, provavelmente, na lembrança das grandes plantações de seringueira da pequena cidade do interior paulista em que nasceu, Guapiaçu. Ele achou que seria mais fácil misturar o colágeno ao leite da seringueira. Fátima não botou muita fé na solução proposta, mas resolveu acatá-la. Como eles precisavam de alguém que fabricasse a prótese experimental, encontraram na região de São José do Rio Preto o químico Antônio César Zabrowski, da empresa Globbor, que vende borracha para a Goodyear. Zabrowski se prontificou a fabricar as próteses e construiu-as com um molde de vidro sanfonado, composto de látex vegetal e 0,1% de colágeno ou polilisina. A prótese experimental, um tubo de 8 centímetros de comprimento por 2 centímetros de diâmetro, foi implantada no esôfago de oito cães. Mas uma ocorrência incomum chamou a atenção dos pesquisadores. Dez dias após o implante, as próteses foram expelidas junto com as fezes do animal.
Eles acharam estranho e resolveram fazer endoscopias para saber o que tinha acontecido, já que nenhum dos cães aparentava estar doente. Ao fim do exame, Fátima e Coutinho ficaram surpresos com a revelação de que, em tão curto período de tempo, um novo esôfago havia se formado no trecho seccionado. Na análise histológica (avaliação do tecido ao microscópio), ele se mostrava praticamente igual a um esôfago normal, com todas as camadas. “Não ficou praticamente nenhuma cicatriz e também não houve a formação de fibrose no local reparado, mostrando um processo de neoformação tecidual”, conta Coutinho. “Os resultados foram surpreendentes e resolvemos investigar a fundo o fenômeno”, relata. Como o corte histológico do material mostrava a presença de grande quantidade de vasos sanguíneos no local onde foi colocada a prótese, isso poderia explicar o processo de reparo (cicatrização) acelerado. Mas essa propriedade do látex de estimular a angiogênese (formação de novos vasos sanguíneos) só foi descoberta porque o polímero não foi obtido pelo método tradicional, conhecido como vulcanização, com temperaturas de 110º C a 125º C.
Zabrowski utilizou uma técnica de polimerização sob condições especiais, desenvolvida e patenteada por ele e, posteriormente, comprada pela Avamax. A comprovação de que o método de obtenção do biopolímero era fundamental no processo de angiogênese foi feita quando os pesquisadores resolveram fazer testes usando luvas e preservativos, que têm como matéria-prima o látex, para ver como se comportavam no processo de cicatrização. “Mas esses materiais não mostram atividade angiogênica”, relata Coutinho. Os testes foram feitos ainda com ovos de galinha embrionados, para avaliar a formação dos vasos, e em orelhas de coelhos, para verificar a rapidez com que ocorre o processo de cicatrização. “A aplicação do biomaterial acelerava um processo neoformador tecidual, altamente organizado, sem cicatriz”, sintetiza o médico. Depois de completar o ciclo de testes com animais, chegou o momento de começar a avaliação do biomaterial à base de látex vegetal em pacientes humanos. Em 1997, Coutinho e Fátima submeteram à Comissão de Ética Médica do Hospital das Clínicas da FMRP pedido para começar os experimentos em humanos. Essa autorização só saiu um ano depois, permitindo ao aluno Paulo César Grisotto, que fazia doutorado na época em Ribeirão Preto, estender e adiantar os estudos, tratando pacientes com úlceras crônicas de difícil cicatrização no hospital de Itajobi (SP), cidade da região de São José do Rio Preto”, relata Coutinho. “Em média, 12 dias depois de os curativos com o biopolímero começarem a ser aplicados nos pacientes, às feridas crônicas, principalmente de portadores de diabetes, começavam a mostrar sinais de evidente granulação e epitelização, contra os seis meses necessários pelos métodos tradicionais, que incluem internação hospitalar”, conta o médico. Segundo levantamento epidemiológico realizado na cidade mineira de Juiz de Fora pelo médico Marco Andrey Cipriani Frade, cerca de 2,7% da população tem úlceras crônicas nos pés e pernas, percentagem que chega a 10% em diabéticos. Essas feridas representam a segunda causa de faltas ao trabalho no Brasil. Seis anos depois de Grisotto ter começado a fazer os experimentos em humanos, o número de pacientes estudados em hospitais de Ribeirão, Itajobi, Juiz de Fora e outros chega a 3 mil, dos quais 2.500 com úlceras e o restante com tímpano perfurado por infecção ou trauma.
Todos os testes foram realizados após aprovação pelas comissões de Ética Médica das respectivas instituições. As cirurgias para refazer a membrana timpânica com a biomembrana de látex foram realizadas pelo Setor de Otorrinolaringologia do Departamento de Oftalmologia e Otorrinolaringologia da FMRP. Essa cirurgia, chamada de miringoplastia, tem como finalidade reconstruir o mecanismo de transmissão sonora. Diversos materiais são usados com esse objetivo, destacando-se a fáscia (camada de tecido fibroso que cobre o corpo sob a pele) do músculo temporal, cartilagem, tecido placentário, entre outros, mas os resultados mostram até 30% de insucessos do ponto de vista anatômico e 19% de reperfuração, causados, principalmente,pela falta de vascularização do enxerto. Já o uso da biomembrana de látex em miringoplastias mostrou intensa vascularização, como indica o trabalho dos otorrinos José Antônio Aparecido de Oliveira e Miguel Ângelo Hyppolito, da USP de Ribeirão Preto, “Miringoplastia com a Utilização de um Novo Material Biossintético”, apresentado em 1998 durante o 34º Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia em Porto Alegre.
A dupla ganhou o primeiro prêmio ao descrever o sucesso dos enxertos com o biopolímero. “Verificamos intensa vascularização em 100% dos enxertos, o que não é habitual quando não se usa a membrana de látex natural”, diz um dos trechos do premiado trabalho. O relato refere-se a apenas 19 tímpanos perfurados que receberam o biomaterial como implante transitório em miringoplastias. Hoje os casos de sucesso chegam a cinco centenas. Duas teses de doutorado, desenvolvidas no Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP, sob a orientação dos professores Jesualdo Cherri e Carlos Eli Piccinato, defendidas pelos cirurgiões vasculares Mário Augusto da Silva Freitas e Paulo Cesar Grisotto, respectivamente em agosto de 2001 e fevereiro de 2003, apontaram, depois de testes feitos em animais, que é possível a recuperação de artérias cardiovasculares por meio da utilização de próteses de látex. Mas ainda são necessários experimentos, antes dos testes em pacientes humanos, para avaliar a eficácia desse material, que poderia vir a substituir as atuais próteses sintéticas ou de materiais biológicos de origem animal, como o pericárdio bovino ou suíno. Essas pesquisas mostram que o biopolímero à base de látex vegetal ainda pode dar origem a muitos outros produtos, com aplicações diversas. Os curativos são apenas o primeiro passo para a Pele Nova Biotecnologia entrar na disputa por um mercado nacional estimado em cerca de 4,5 milhões de pessoas, que, provavelmente, não podem pagar os altos valores dos medicamentos importados.
Um dos pontos nos quais a direção da Pelenova aposta para conquistar mercado é o preço. A caixa do biocure com vinte unidades vai custar R$ 28,50, o equivalente a US$ 10. No mercado internacional produtos semelhantes são muito mais caros porque se baseiam na produção de células vivas, de custo industrial altíssimo, diz Silva. No Japão, o preço de um medicamento deste tipo chega a US$ 500. O potencial de aceitação do produto é enorme, estima à direção da Pelenova, com base em dados do mercado. Segundo informações da Associação Nacional de Assistência ao Diabético e da Sociedade Brasileira de Diabetologia existem cerca de 5,4 milhões de diabéticos diagnosticados no país. No mundo, cita a Pelenova, a Organização Mundial de Saúde estima que 2% de toda a população têm problemas de cicatrização. A princípio, a Pelenova vai manter-se concentrada no mercado interno, com distribuição em hospitais e clínicas médicas. A estratégia é comprovar o a eficácia do produto neste segmento para só depois evoluir para a venda ao varejo e as exportações.
“Vamos comer esse salame por fatias”, observa Silva. A fábrica piloto da Pelenova foi instalada em Terenos (MS), em uma área cedida por um dos acionistas da companhia. A unidade tem capacidade de produzir 26 mil biomembranas por dia, o equivalente a uma produção mensal de 520 mil unidades. Dependendo da evolução do negócio, a companhia vai decidir onde e quando construir uma fábrica definitiva. O prazo de retorno financeiro é difícil de definir porque não há produtos similares no mercado, justifica Silva. A previsão de parte dos acionistas, porém, é de um retorno rápido, conta o empresário. “Alguns acreditam em um retorno até o fim do ano e há os que acham que isso vai ocorrer até antes.”. “Nossa ideia é primeiro fortalecer o negócio no Brasil e depois partir para o exterior. Mas interessados de diversos países do mundo já têm feito contato conosco”, diz Aguiar, diretor comercial e administrativo da empresa. De acordo com Ozires, a Pele Nova quer conquistar entre 3% e 4% dos consumidores norte-americanos que necessitam do tratamento e usam os medicamentos da concorrência. Para isso, o empresário cogita inclusive criar uma empresa nos Estados Unidos, se for necessário. Cinquenta funcionários trabalham hoje na Pele Nova. Esse número deve ultrapassar 300, quando a empresa estiver fabricando de 250 mil a 500 mil curativos por dia. Os resultados foram superiores aos dos dois produtos similares no mercado: o Becaplermin e o Apligraphi. O primeiro é o gel comercializado pela Johnson & Johnson que contém uma proteína humana cultivada em bactérias. Já o Apligraphi é o processo de transplante de pele humana patenteado pela Novartis. De acordo com Coutinho, além de custar US$ 1.200 mais as despesas cirúrgicas, o Apligraphi corre o risco de ser rejeitado pelo organismo do paciente. A Pele Nova se prepara para lançar mais dois produtos em 2005, quando deverá funcionar seu laboratório de pesquisa especializado em biomembranas. “Nada impede que façamos produtos para uso interno”, diz Ozires, cogitando a recuperação de órgãos como o rim e o pâncreas a partir da mesma tecnologia. “Com o látex, já é possível refazer o tímpano com 98% de sucesso”, diz Coutinho. O pesquisador também começa a estudar em animais sua aplicação para a recomposição arterial, o que poderia, mais adiante, auxiliar a regeneração das artérias em operações de ponte de safena.
O BIOCURE® é produzido industrialmente através da tecnologia biomembrana® , patenteada em mais de 60 países e desenvolvida ao longo dos últimos dez anos por cientistas brasileiros. Trata-se de material ativo que induz a formação de novos vasos sanguíneos. 1,2,3,4,5,6 – angiogênese – na superfície sobre a qual é aplicado. Utilizado em úlceras crônicas diabéticas, vasculares , de pressão (escaras de decúbito), pós-cirúrgicas ou traumáticas, BIOCURE® é capaz de acelerar a regeneração tecidual, auxiliando feridas que duram meses, às vezes, anos, para cicatrizar. Produto de dez anos de pesquisa e desenvolvimento biotecnológicos , BIOCURE® é produzido a partir da polimerização do poli-isopreno de origem vegetal. Em estudos realizados durante todo este período, BIOCURE® demonstrou possuir microarquitetura particular, comprovada biocompatibilidade e importante propriedade de indução do processo cicatricial. Indicado no tratamento de feridas, agudas e, em particular, as crônicas de difícil cicatrização, BIOCURE® deve ser aplicado diretamente sobre a superfície da lesão.
Fonte: http://www.uol.com.br/cienciahoje/chdia/n450.htm
http://www.estadao.com.br/ciencia/noticias/2001/set/18/319.htm
http://www.agendasaude.com.br/materias/index.asp?Cod=166
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http://www.usp.br/agen/bols/1998_2001/rede816.htm
http://noticias.uol.com.br/inovacao/ultimas/ult762u1349.jhtm
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http://www.pelenova.com.br/site/conteudo.php?Area=aempresa&cont=historico
http://nasvf.org/lavca/allpress.nsf/ae29604d842843da86256bf800565435/d4745e246f794d4386256ec6001b8535?OpenDocument
http://www.universiabrasil.com.br/inove/noticia.jsp?Noticia=60
Acesso em julho de 2005
http://www.finep.gov.br/premio/fotos_premiacao_2006/solenidade_planalto/pages/foto_de_joao_luiz_ribeiro_24_jpg.htm
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http://www.agencia.fapesp.br/materia/10216/divulgacao-cientifica/marcas-esmaecidas.htm
Acesso em março de 2009