O trabalho de um grupo brasileiro foi publicado em dezembro de 2002 com destaque em uma das mais importantes revistas científicas da atualidade, a Physical Review Letters, nos Estados Unidos. Eles identificaram problemas básicos na construção de fios elétricos de ouro com apenas um átomo de espessura (ou seja, 0,4 nanômetros). O estudo ganhou destaque porque o ouro é um metal estratégico da próxima geração de computadores. Como reage pouco com outros elementos, é um metal muito bem comportado e estável, ideal para a fabricação das peças básicas de um computador. “Queríamos ajudar a entender os movimentos dos átomos de ouro quando se tenta fabricar fios tão finos”, diz Adalberto Fazzio, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), um dos membros da equipe. Os outros são Antônio José Roque, também da USP, e Edison Zacarias, do Laboratório Nacional de Luz Sincrotron, em Campinas, um dos mais sofisticados do país.
Para se ter uma ideia da dificuldade dos cientistas é preciso entender que o nano mundo é um lugar terrivelmente agitado, especialmente por causa da temperatura. Nessa escala de tamanho, as ondas de calor parecem maremotos, atirando átomos e moléculas para todos os lados. Quer um exemplo impressionante? Então, é só imaginar o ar. Se não há vento, a impressão é de que ele está parado, mas é um engano: mesmo a uma temperatura amena, de 22 graus Celsius, as moléculas de oxigênio estão em movimento constante, chocando-se umas com as outras a cerca de 1.800 quilômetros por hora. É verdade que o ar é um gás e os pesquisadores trabalham com metais, onde a turbulência é bem menor do que isso. Mesmo assim, os átomos vibram sem parar e simplesmente se recusam a ficar no lugar certo, na hora de fabricar uma peça. É como tentar construir um carro com parafusos que ficam pulando de um lado para outro o tempo todo. Isso é o que os nano cientistas estão tentando aprender: a arte de controlar essas peças saltitantes e, com isso, criar as primeiras nano máquinas da História.
A influência de impurezas no rompimento de nano fios de ouro foi estudada através de simulação computacional pelos professores Adalberto Fazzio e Antônio José Roque da Silva, ambos do Instituto de Física (IF) da USP. Os nano fios podem vir a ser estratégicos para a fabricação de futuras gerações de computadores, servindo como conexão para dispositivos baseados em eletrônica molecular. Um nano fio é, em geral, formado por quatro ou cinco átomos de ouro ligados um a um, constituindo um fio em escala nano métrica. “Um nanômetro (nm) é aproximadamente dez mil vezes menor que a espessura de um fio de cabelo”, compara José Roque. A menor distância entre dois átomos em um cristal de ouro é de 0,29 nm. As simulações feitas por Fazzio e Roque mostram que, quando puros, os nanofios tendem a se romper com distância máxima de aproximadamente 0,31 nm. Contudo, medidas experimentais realizadas pelo grupo de Daniel Ugarte no Laboratório Nacional de Luz Sincrotron (LNLS) em Campinas observaram que alguns fios ao romper apresentam uma separação de 0,36 nm entre os átomos de ouro, chegando até a 0,48 nm.
Para explicar os resultados obtidos no LNLS, o estudo verificou o efeito de diferentes impurezas na quebra do fio de ouro. Concluiu-se que um átomo de hidrogênio entre dois de ouro resulta na distância máxima de 0,36 nm. Uma partícula de enxofre altera o resultado para 0,47 nm. “Com relação ao enxofre, a incerteza é maior, pois a distância é grande e podem existir muitas combinações possíveis que somem 0,48 nm”, ressalta Fazzio. A influência de boro, carbono, oxigênio e nitrogênio nos fios de ouro também foi testada. Roque explica que o elemento ouro tem 79 prótons e 79 elétrons, ou seja, é muito maior que os outros átomos: o enxofre tem 16 prótons e 16 elétrons e o hidrogênio, um próton e um elétron. “Essas diferenças impedem a observação direta das impurezas pelo microscópio, por isso a importância das simulações computacionais.” As simulações são feitas resolvendo-se equações da Mecânica Quântica. “Nosso trabalho é teórico, mas tem forte ligação com o experimental”, expõe Fazzio. “O computador resolve equações descrevendo o comportamento dos elétrons para uma dada configuração atômica, com a maior precisão possível.”
O professor explica que os fios de ouro serão de grande valia para a tecnologia do futuro, que depende do metal para fazer a ligação de nano circuitos. O primeiro trabalho mostra como é possível simular no computador a evolução de um fio de ouro enquanto o mesmo é puxado. Neste processo, o fio afina aos poucos até se tornar uma cadeia linear com apenas alguns átomos. Este fio eventualmente se rompe. No segundo trabalho, a equipe mostrou, usando simulações computacionais, que impurezas leves como hidrogênio, carbono, boro e oxigênio, que os experimentos na observariam, poderiam ser a causa das grandes distâncias de ligação entre átomos de ouro no fio imediatamente antes do rompimento do fio. O primeiro resultado da pesquisa foi publicado em dezembro de 2001. Em junho de 2002, o projeto foi divulgado na primeira edição brasileira da revista Scientist American. Edison Zacharias esclarece que a pesquisa é uma contribuição de dois anos entre ele, os professores Antônio José Roque, da USP, e Adalberto Fazzio, e o aluno de doutorado da USP Frederico de Novaes, primeiro autor deste segundo trabalho com fios de ouro.
Fonte: http://galileu.globo.com/edic/129/rnano.htm
http://www.usp.br/agen/bols/2003/rede1161.htm (Beatriz Camargo)
http://www.ifi.unicamp.br/IFWeb-PT/midia/nanowires-FSP04012002.pdf (Salvador Nogueira)
http://www.brasilnews.com.br/fonte2.php3?Codreg=675&CodNext=999
Acesso em setembro de 2003