Quando Warwick Kerr assumiu pela primeira vez a direção do INPA, em 1975, se encantou com as possibilidades de estudos e com a riqueza natural da Amazônia. Seu objetivo era criar linhas de pesquisa e investir na formação de cientistas. Ao mesmo tempo, ele percebia que as comunidades locais apoiavam o trabalho dos pesquisadores e se dispunham a ajudar. Isso o levou a realizar projetos que pudessem beneficiar diretamente essas pessoas. O geneticista tentou criar um grupo de estudos que não competisse com o formado pelo Embrapa na Amazônia. Organizou a Cartilha do Amazonas, que adotava a terminologia dos índios e ensinava a cultura regional, e procurou apoiar alunos de ensino fundamental e médio. A experiência despertou em Kerr o desejo de realizar pesquisa em um estado pobre. Com essa decisão, partiu em 1981 para o Maranhão, onde estudou hortaliças e desenvolveu vegetais de melhor qualidade. A região e os maranhenses conquistaram Warwick Kerr, que conta só ter deixado o estado porque sua esposa, Lygia, preferiu se mudar. Por essa razão, aceitou em 1989 um convite de trabalho na UFU, onde dá continuidade aos trabalhos realizados em São Luiz.
Trabalhos daquela época indicavam que as crianças pobres desse estado tinham deficiência de vitaminas B1, B2 e A. Preocupado com essa realidade, Kerr decidiu se dedicar ao melhoramento genético de hortaliças — vegetais mais nutritivos poderiam ajudar a combater doenças motivadas por avitaminose. Kerr conseguiu modificar alguns vegetais e torná-los mais ricos e adaptados ao clima de São Luiz. Um exemplo de cultivar (variedade) obtido pela equipe de Kerr foi o feijão-macuco 8% mais rico em proteínas que a cultivar obtida no México. Uma nova variedade da macaxeira-amarelinha também se mostrou melhor em produtividade e qualidade (alto teor de vitamina A) que a espécie branca de São Luiz.
Trabalhar com as comunidades locais também permitiu a Kerr e sua equipe conhecer um pouco mais a medicina e sabedoria popular. “Eles sempre têm muito a ensinar”, diz. Quando foi para a UFU, em 1989, Kerr continuou a estudar o melhoramento genético de hortaliças e desenvolveu uma variedade de alface surpreendente — a “Uberlândia 10 mil”, 20 vezes mais rica em vitamina A que a alface comum. Três folhas dessa cultivar são suficientes para suprir as necessidades diárias da vitamina no organismo.
Kerr acredita que a produção de alimentos geneticamente modificados pode ser uma das maneiras de se garantir à população uma maior qualidade nutritiva. “Sou a favor de produzirmos nossos próprios alimentos transgênicos”, defende. “É um absurdo o governo proibir a produção nacional.” O cientista esclarece que, produzidos sobre controle, esses alimentos não causariam mal algum. Warwick Kerr também procura cultivar em outras regiões plantas amazônicas ricas em vitaminas. Entre as espécies que o cientista levou para a região de Uberlândia estão a moringa, fonte de vitamina A, e o camu-camu, a fruta que mais concentra vitamina C.
Em 1982, perguntado sobre os mecanismos de proteção da propriedade intelectual Kerr responde: “Uma medida que eu acho que deveria ser tomada imediatamente seria a de não pagarmos mais patentes. Deveríamos sair do acordo internacional, para podermos copiar os inventos sem o pagamento de royalties, como é feito no Japão. pelo menos por dez anos poderíamos copiar e traduzir livros que quiséssemos, sem pagar coisa nenhuma. Não seria uma medida antiética porque iria salvar da miséria os cérebros que se estão degenerando. Muitas descobertas foram fechadas ‘as outras partes do mundo por grandes companhias, num controle artificial da produção científica. Eu sou a favor de uma abertura de todas as pesquisas, inclusive porque este é , em geral, o desejo dos cientistas”.
Fonte:
http://www.uol.com.br/cienciahoje/perfis/kerr/kerr3.htm
acesso em julho de 2002
Cientistas do Brasil, SBPC, 1998, página 11