Química

Polímero Anti-Hipertensão

Cientistas brasileiros estão misturando um tipo de molécula produzido naturalmente pelo organismo humano com polímeros para criar novas armas contra a hipertensão e doenças como a leishmaniose. O trabalho rendeu seis pedidos de patente -coisa rara na pesquisa nacional. As moléculas desenvolvidas pelo químico Marcelo Ganzarolli de Oliveira e seus colegas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) são chamadas de doadoras endógenas de NO. O nome é difícil, a função, simples: elas carregam em sua cadeia de átomos o óxido nítrico (NO), substância fundamental para uma série de processos fisiológicos. Ele ajuda na circulação sanguínea, no ataque a micróbios e na transmissão de mensagens no sistema nervoso, por exemplo. Oliveira conta que começou a lidar com as funções do NO durante o seu pós-doutorado, quando estudava o nitroprussiato de sódio -um composto doador de NO já utilizado para o tratamento de hipertensão. Mas o pesquisador descobriu que a substância também oferecia risco de contaminação por cianeto, um veneno que poderia ser subproduto de seu uso no organismo.

Foi em busca de uma alternativa que ele se deparou com os famigerados doadores endógenos de NO. “Havia um certo tabu na área em relação a eles, porque as pessoas achavam que eles eram instáveis demais, ou seja, liberavam o NO muito rápido”, explica o químico. Ele descobriu, no entanto, que essa instabilidade dependia da concentração –em soluções diluídas, a molécula sossegava. O pesquisador conseguiu refinar ainda mais o sistema, no entanto, misturando a substância com uma série de polímeros (substâncias orgânicas de cadeia longa, formadas por várias unidades repetidas) não-tóxicos. A estabilidade dos doadores de NO aumentava ainda mais, e se tornava possível uma liberação controlada de óxido nítrico ao longo do tempo. “A matriz polimérica aprisiona o NO e faz com que ele se difunda lentamente para fora”, explica Oliveira. Uma das patentes pedidas se refere à maneira de sintetizar o doador de óxido nítrico diretamente na matriz polimérica, enquanto outras englobam as várias versões que ela pode ter: líquida, sólida ou em forma de gel. 

Faltava testar o potencial terapêutico dos novos produtos. Primeiro em ratos (com a ajuda de pesquisadores do Instituto de Biologia da Unicamp) e depois em pessoas saudáveis, Oliveira conseguiu mostrar que a aplicação dos polímeros sobre a pele era capaz de dilatar os vasos sanguíneos e aumentar o fluxo sanguíneo na área. Injetado, o polímero ajudaria a enfrentar a hipertensão; sobre a pele, o aumento do fluxo sanguíneo ajudaria a combater ferimentos levando mais nutrientes à área afetada. Além disso, as feridas na pele que caracterizam a leishmaniose poderiam ser amenizadas, diz Oliveira, já que o micróbio que a causa seria destruído pela liberação do NO. Outra aplicação vislumbrada é recobrir com o polímero os “stents” que mantêm abertas artérias antes obstruídas. É que o NO impede a multiplicação das células da parede do vaso, evitando a volta da obstrução. 

O trabalho de Marcelo Ganzarolli de Oliveira, Watson Loh, Amedea Barozzi Seabra e Silvia Mika Shishido recebeu Menção honrosa no Prêmio Governador do Estado de 2002. O trabalho trata de formulações de S-Nitrosotióis doadores de óxido nítrico incorporados em géis aquosos termicamente reversíveis de copolímero tribloco de poli (óxido de etileno) – poli (óxido de propileno) – poli (óxido de etileno) pluronic F-127 ou poloxamer 407 e metodologia de incorporação de S-Nitrosotióis em matrizes de géis aquosos de pluronic F-127 ou poloxamer 407. A patente PI 0004238 trata de formulações de s-nitrosotióis doadores de óxido nítrico incorporados em matrizes de poli (etileno glicol), poli (etileno glicol/água) e poli (etileno glicol)/etileno glicol e metodologia para incoporação de s-nitrosotióis em matrizes de poli (etileno glicol) , poli (etileno glicol)/água) e poli (etileno glicol)/etileno glicol caracterizadas pelo fato de que os S-nitrosotiois que fazem parte das formulações ora propostas são: a) Snitrosocisteina (S-nitroso-L-mercaptoalanina – C~ 3~H~ 6~N~ 2~O~ 3~S), (CisNO); b) S-nitroso-n-acetilcisteina (ácido S-nitroso-L<244>-acetamido-<225>-mercaptopropionico – C~ 5~H~ 8~N~ 2~O~ 4~S), (SNAC); e c) S-nitrosoglutationa (S-nitroso-N-(N-L-y-glutamil-L-cisteinil) glicina – C~ 10~H~ 16~N~ 4~O~ 7~S), (GSNO). 

O desenvolvimento de biomateriais para liberação controlada de óxido nítrico em tratamentos e aparelhos médicos já gerou sete requerimentos de patentes, protocolados pelo Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (IQ-Unicamp), junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). O óxido nítrico (NO) é uma pequena molécula – composta por um átomo de nitrogênio e outro de oxigênio – de grandes efeitos fisiológicos, conforme define Marcelo Ganzarolli de Oliveira, coordenador do grupo de pesquisa com os biomateriais, no IQ-Unicamp. Trata-se de uma molécula produzida pelo organismo dos mamíferos, mas que também pode ser obtida através dos chamados compostos doadores de óxido nítrico, de origens e composições diversas. 

Entre suas propriedades está a de controlar a pressão arterial, contribuindo para aumentar a eficácia de tratamentos contra arterosclerose e em caso de crises de hipertensão e angina, por exemplo. Também é uma molécula utilizada pelo sistema imunológico, nos processos de defesa do organismo contra agentes patológicos – e, entre eles, o protozoário causador da leishmaniose – e no sistema cardiovascular, como um neurotransmissor. Iniciada em 1995, a pesquisa da Unicamp visa obter compostos atóxicos, que possam ser combinados a materiais poliméricos (como filmes ou adesivos farmacológicos) ou alguns tipos de gel, permitindo sua liberação controlada. Tais produtos substituem, com vantagens, os medicamentos atuais, à base de nitroglicerina (a mesma dos explosivos) e nitroprussiato de sódio (que contém o veneno cianeto). Além de eliminar o risco de intoxicação, as novas substâncias produzem os efeitos desejados mais rápido e por períodos mais prolongados, permitindo a redução das doses e dos riscos dos tratamentos cardiovasculares. 

Três compostos de uma mesma classe química já foram testados e aprovados em laboratório e, em alguns casos, avaliados em modelos vivos (ratos e camundongos). Através de uma parceria com o Instituto do Coração (Incor), ligado à Universidade de São Paulo, agora terão início os testes em voluntários humanos, que devem durar alguns anos. “Também desenvolvemos um biomaterial para recobrimento de aparelhos médicos, como os utilizados em angioplastias ou cateterismo”, conta Ganzarolli de Oliveira. A função dos compostos doadores de óxido nítrico, nestes casos, é evitar a trombose da artéria e/ou provocar o relaxamento muscular, com a conseqüente diminuição da pressão arterial. A equipe testou, com sucesso, o recobrimento de stents, uma pequena malha metálica usada para a dilatação de artérias em processo de arterosclerose. 

Outro desenvolvimento, este realizado em parceria com o médico dermatologista escocês Richard Weller, da Universidade de Edinburgo, resultou na produção de um gel de aplicação externa capaz de acelerar a cicatrização de queimaduras e feridas de leishmaniose cutânea, além de tratar psoríase. Os recursos para os equipamentos utilizados nas pesquisas com os novos biomateriais, nestes 8 anos, vieram da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), no valor total aproximado de R$ 87 mil. O custeio é proveniente de bolsas de mestrado e doutorado da Fapesp e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e de auxílios individuais à pesquisa. Já foram concluídos 3 mestrados e um doutorado, neste área, e mais 2 doutorados e 2 mestrados estão em andamento. A equipe ainda conta com a colaboração de mais dois pesquisadores do Instituto de Química, um do Instituto de Biologia e outro da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, além das equipes do Incor e Universidade de Edinburgo. Um novo financiamento a equipamentos de avaliação dos biomateriais deverá permitir, em breve, o desenvolvimento de filmes e géis para outras finalidades médicas, sempre explorando as propriedades fisiológicas do óxido nítrico. 

Fonte: http://www.unicamp.br/prp/edistec/premios.htm 
acesso em março de 2003 
AGÊNCIA ESTADO DATA: 29/10/03 ON-LINE “Unicamp desenvolve biomateriais revolucionários para aplicação médica” 
“Unicamp cria polímero anti-hipertensão”, Autor: REINALDO JOSÉ LOPES, Fonte:Folha On-Line 15/12/03 
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