Inspirado nas possibilidades técnicas e econômicas de antigos métodos, o Prof. Francisco Casanova, aperfeiçoou uma técnica de construção batizada de solo-cimento, capaz de diminuir o custo de construção de uma casa em até 50%, utilizando o próprio solo e um pouco de cimento nas fundações e na confecção de tijolos. A mais recente experiência com este sistema de construção vem sendo realizada na favela do rato Molhado, na baixada fluminense. No município de Cabo Frio já foram construídos 14 sobrados de dois andares a um custo de apenas 172 reais o metro quadrado e em Santa Catarina o Professor apoiou tecnicamente integrantes do Movimento dos Sem Terra (MST). Cada uma das treze casas de 70 m2 construídas custaram em média R$ 2.500,00 ( dois mil e quinhentos Reais). Para os incrédulos, descrentes de que uma casa de tijolo possa ser erguida com apenas esta quantia, o professor garante que o processo de confecção dos tijolos é muito simples, mas tem que ser monitorado. A proporção de cimento varia entre 5 e 10%, dependendo da consistência do solo, logo a massa deve ser corretamente colocada em prensas manuais ou hidráulicas e compactada. Após serem retirados da prensa, os tijolos devem permanecer num ambiente úmido, sem vento e sem sol, durante uma semana. As peças são produzidas para serem simplesmente encaixadas uma nas outras, dispensando o uso de argamassa.
“A grande economia gerada pelo solo-estabilizado reside no ganho de tempo. A obra leva metade do tempo para ser finalizada em relação à alvenaria convencional”, afirma o Prof. Casanova. Uma casa de 50m2, utilizando métodos comuns, por exemplo, leva 60 dias para ficar pronta. Se fosse construída utilizando a técnica do solo-cimento, levaria apenas 40 dias. Na ponta do lápis, se na obra são utilizados os serviços de um pedreiro e dois serventes a R$100 por dia, a economia é de, no mínimo, R$ 2 mil, ou seja, 33% só em mão-de-obra. Segundo o pesquisador, o solo-cimento tem como vantagens adicionais oferecer um conforto térmico e acústico muito superior ao das construções convencionais e o local de obra é muito mais limpo, pois gera muito pouco entulho.
Outro fator que torna o tijolo barato é a economia de energia na sua produção. Para se ter uma idéia, mil tijolos de argila queimada (o tijolo tradicional) precisam de 1 m3 de madeira para ser produzidos, o que equivale mais ou menos a seis árvores de porte médio. O custo do frete também pode ser eliminado, pois o solo do próprio local da obra pode ser utilizado na confecção dos tijolos. Uma outra vantagem ainda é que ao contrário dos tijolos de argila queimada, que quando quebram têm que ser jogados fora, os de solo-cimento podem ser moídos e reaproveitados. A fórmula do invento começou a ser elaborada quando Casanova resgatou o tijolo de solo estabilizado em laboratórios europeus. Depois de se formar em química na UFRJ, passou pela Suíça, França e Portugal como aluno de mestrado e doutorado em engenharia civil pela Coppe. Foi na Europa pós-guerra que foi buscar o remédio para o Brasil sem teto.
Atualmente a ONU estima que, para satisfazer as necessidades mais elementares de moradia no mundo até final do ano 2000, serão necessárias pelo menos 500 milhões de casas. “Baseado no atual cenário econômico-social, o solo se revela como o material com maior vocação para retomar o hábito de compatibilizar, harmonicamente, o projeto arquitetônico, os materiais locais e o sistema construtivo”, pondera o pesquisador. O trabalho de Casanova foi reconhecido em reunião anual da UNESCO. Há mais de duas décadas, o professor percorre de favelas a empreiteiras, de prefeituras brasileiras aos governos no exterior, em busca de quem queira financiar o invento, até pouco tempo relegado às prateleiras pelos próprios acadêmicos. Agora, depois do aval das Organizações das Nações Unidas (ONU) e do Musée de Caen, na França, seu projeto começa a sair do papel. Foi depois que o professor expôs seu projeto no Fórum Internacional de Ação Solidária para o Desenvolvimento Social da Unesco, em Paris, há dois anos, e seu estudo publicado em mais de 140 línguas, que suas idéias foram reconhecidas.
O Governo da República Dominicana acaba de concluir 100 casas populares construídas com técnica brasileira desenvolvida na COPPE pelo professor Francisco Casanova. As moradias foram inauguradas em novembro, durante a 12 ª Cúpula Íbero – Americana, que reuniu governantes de 21 países. No evento, realizado em novembro de 2002, na cidade de São Domingos, na Republica Dominicana, os governantes, entre eles o Presidente Fernando Henrique Cardoso, tiveram a oportunidade de conferir os resultados da técnica desenvolvida no Brasil que, além de custos mais baixos, traz vantagens sócio-ambientais: gera empregos e reduz em 90 % o consumo de energia em relação ao método de construção convencional.
A receita do tijolo de solo estabilizado é simples: mistura-se solo, água e uma pitada de cimento e leva-se a massa para uma prensa. Depois de sete dias protegido do sol, está pronto. Como apoio do CNPq, da Faperj e Finep, Casanova aperfeiçoou a técnica, estudando as peculiaridades dos solos brasileiros e transformando a lição européia em casa dos sonhos por aqui. Feito brinquedo de criança, o tijolo encaixa um no outro, sem necessidade de cimento, até levantar a construção. Depois é só passar um impermeabilizante e aplicar cimento nas colunas de sustentação. A casa pode ser em tons de vermelho, bege, amarelo, branco, dependendo das propriedades do solo. Do ponto de vista da proteção ambiental, o tijolo e o cimento feitos de lixo industrial são ainda mais verdes.
Depois de criar fórmulas com todo tipo de solo, do argiloso ao arenoso, o professor decidiu tentar usar os rejeitos que se acumulavam nos pátios de fábricas de química, metalurgia, siderurgia, mineração, pedreiras e galvanização. Amontoados em galpões, estes resíduos ocupam espaço, poluem o solo e contaminam lençois de água no subsolo. E esse lixo, visto como problema, virou sinônimo de solução. A escória, resíduo das usinas siderúrgicas, é a base para a composição do cimento verde. A cada tonelada de aço produzido, mais de 300 quilos de uma espécie de lava escorre dos altos fornos, a 1600 0C. Resfriada, torna-se uma espécie de areia, formada pela argila do minério de ferro misturada com silício e alumínio: a escória. Volta Redonda virou um paraíso para Casanova. Berço da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a cidade atraiu muitas outras indústrias de base, todas produtoras de matéria-prima para o cimento e o tijolo de Casanova. O cimento de sobrenome “verde”, demora mais a secar do que o cimento convencional, mas é mais compacto e resistente. Melhor: não precisa ir para o alto forno, como acontece nas indústrias de cimento Portland, com mérito de economicamente viável.
As cimenteiras são um alvo favorito do professor. Ele critica a Votorantim e a Tupi por não doarem um pouco da escória que compra da CSN para o projeto da prefeitura de Volta Redonda. “Falta à universidade e principalmente ao empresariado o que nos países ricos se denomina de cidadania corporativa”, dá bronca. Outras empresas da região, no entanto, colaboraram doando resíduos. “A gente até entende. De alguma forma, vamos concorrer com eles”, consola-se o engenheiro Paulo Neto, coordenador do projeto. Não é só o sobrenome que parece traduzir o trabalho de Casanova. O nome Francisco também parece adequado para quem, como ele, costuma subir favelas para ajudar na construção de casas. Ele junta gente em escolas improvisadas e ensina as fórmulas do ramo da construção para serem postas em prática em forma de mutirão. Está caro o tijolo, está caro o cimento? “Organizem-se que eu ensino”, diz ele.
Há pelo menos dez mil anos o homem utiliza o solo como material de construção. Como evidência destas técnicas, utilizadas intensivamente pelos gregos e difundidas pelos romanos, temos como vestígios edificações que estão de pé até hoje desafiando o tempo após milhares de anos. No Brasil, cidades como Ouro Preto, Diamantina e Paraty têm em comum quatro séculos de história que testemunham o uso intensivo da taipa-de-pilão, do adobe, e da taipa-de-sopapo ou pau-a-pique. “O solo não é de modo algum um material estranho à nossa herança cultural. Pelo contrário, estas cidades atestam ainda hoje todas as possibilidades destas técnicas”, afirma o Casanova. Os métodos de construção utilizando solo foram intensamente utilizados até 1845, quando surgiu um novo material, o cimento Portlant. A partir de meados do século XIX, o solo começou a ser visto como material de segunda categoria e passou a ser utilizado, quase que exclusivamente, nas áreas rurais. “Um grande equívoco”, lamenta o pesquisador. Segundo Casanova, esta tecnologia é uma amálgama entre arquitetura, engenharia, tecnologia e liberdade social. “Considero uma ironia que, na era pós-industrial, tenhamos que recorrer as bases de um método utilizado por nossos ancestrais para gerar uma alternativa para a solução do grave problema de déficit habitacional”, afirma Casanova.
A utilização de tijolo modular de solo-cimento e de mão de obra em mutirão em construções populares dá prêmio ao Projeto Habitacional Cajuru, na cidade de Sacramento. Entre 523 projetos apresentados por empresas de todo o país, o Projeto Cajuru ganhou o primeiro lugar no Prêmio Tecnologia Social da Fundação Banco do Brasil. A premiação aconteceu no dia 6 de novembro em São Paulo. O coordenador do mutirão, Marcos Antônio da Silva, acompanhado de um dos responsáveis técnicos pela obra, Daniel Bertolucci, esteve na capital paulista para representar a cidade de Sacramento e receber o prêmio.
A idéia do tijolo solo-cimento não é novidade e já foi empregada na construção da Muralha da China, há mais de 4 milênios. De lá para cá, sua utilização sofreu modificações quanto ao uso e formatos, porém em pequena escala, comparado ao processo tradicional de construções. O engenheiro civil recém-formado pela Universidade de Uberaba, Daniel Bertolucci Silva, 24 anos, explica que o tijolo solo-cimento é um material elaborado no próprio canteiro de obras. Os materiais fornecidos pelo solo são misturados com água e cimento. Esta mistura é prensada em uma máquina para adquirir forma. Feita a modelagem, o tijolo sofre processo de cura e após sete dias, pode ser empregado na obra.
“Além de reduzir os custos da obra, o tijolo permite otimização de tempo, elimina o desperdício e facilita seu manuseio e aplicação pelo formato que possui. As peças tem formas côncavas e convexas que permitem um fácil encaixe, como um brinquedo Lego, eliminando assim a necessidade de massa para fazer a emenda das peças”. Além disso, Daniel afirma que o tijolo possibilita a edificação de obras com qualidades estruturais, fácil colocação de tubulações para redes hidráulicas, de telefone e de energia. A constituição física do tijolo permite um isolamento térmico e acústico, garantindo conforto ambiental da edificação sob diversas condições climáticas e reduzindo ruídos externos. Esta é a base de pesquisa do engenheiro, que está fazendo mestrado com ênfase em edificações na Universidade de Campinas (Unicamp).
Fonte:
http://www.planeta.coppe.ufrj.br/noticias/noticia000057.html
http://www.planeta.coppe.ufrj.br/planetacoppe.old/noticias/noticia000175.html
http://www.revelacaoonline.uniube.br/cidade/sacramento.html
http://redeglobo5.globo.com/pegn/PegnTV/pegn26112000.htm
acesso em março de 2002
http://www.meusite.pro.br/habitat/casanova.htm
acesso em outubro de 2002
http://www.planeta.coppe.ufrj.br/ acesso em janeiro de 2003
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